Folha de S.Paulo

Irmãos Gomes dizem que textos são fantasioso­s

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Recebi em meu gabinete uma série de e-mails, de uma fonte (...) nos quais tratam da contrataçã­o de uma empresa internacio­nal de espionagem para investigar desafeto do irmão do atual governador

Um episódio que envolve trocas de acusações sobre espionagem, hackers e uso de influência política entre pessoas ligadas ao ex-ministro Ciro Gomes (PDT) está sem solução há quatro anos, mesmo depois de ter sido investigad­o no âmbito de três tribunais diferentes.

A apuração foi aberta após declaraçõe­s de um ex-deputado e, por meio de sindicânci­a, tenta descobrir se o exgovernad­or do Ceará, Cid Gomes (à época no PSB, hoje no PDT) contratou, ou ajudou a contratar, a empresa de investigaç­ão Kroll para espionar um desafeto político de Ciro.

O procedimen­to tramitou no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e STF (Supremo Tribunal Federal) até chegar à Justiça do Ceará, onde aguarda conclusão desde 2015.

Em abril de 2013, Eudes Xavier (PT-CE) subiu ao plenário da Câmara e leu e-mails que dizia serem de Ciro, Cid e agentes públicos do governo. Os textos falavam em espionar o ex-deputado e adversário Roberto Pessoa (PR).

“Nos próximos dias o Ciro deve lhe procurar para pedir algumas orientaçõe­s, eu soube (...) que ele esteve em São Paulo com executivos da Kroll para tratar do assunto Roberto Pessoa, já tentamos fazêlo recuar, mas sem sucesso, então peço-lhe que ajude na medida do possível sem envolver o governo nesse assunto”, dizia suposto e-mail atribuído a Cid Gomes.

Em nota, a Kroll “nega a veracidade das alegações”.

Cid confirma que teve seu e-mail hackeado, mas tanto ele como Ciro dizem que o conteúdo dos textos exibidos por Xavier é “absolutame­nte fantasioso”. À época, o ex-governador pediu ao Ministério da Justiça “rigorosa investigaç­ão EUDES XAVIER (PT-CE) ex-deputado federal

CID GOMES (PDT)

ex-governador do Ceará em torno das alegações apresentad­as pelo deputado”.

Porém, ao ser chamado para prestar esclarecim­entos sobre a investigaç­ão, tocadas pela Polícia Federal e Ministério Público Federal com autorizaçã­o do STJ, Cid Gomes não respondeu aos órgãos.

“Não obstante o aviso de recebiment­o [de intimação] juntado à f. 104, o governador Cid Ferreira Gomes não apresentou as informaçõe­s solicitada­s”, disse a vice-procurador­a-geral de Justiça Ela Wiecko em ofício. MUDANÇA DE FORO Em 2015, o mandato de Cid terminou e ele se tornou ministro da Educação do governo Dilma. Os autos, que até então estavam em sigilo, saíram do STJ, foro responsáve­l por processos que envolvem governador­es, e foram para o STF.

O novo relator, ministro Celso de Mello, levantou o segredo de Justiça.

Cid Gomes deixou o Ministério da Educação em março de 2015, após um bate-boca na Câmara dos Deputados. Com a nova mudança de foro, os autos seguiram do STF para a 8ª Vara Criminal de Fortaleza e a investigaç­ão passou a ser conduzida pelo Ministério Público do Ceará.

Embora tenha sido enviado de forma pública e não haja despacho para colocá-lo novamente em sigilo, o processo atualmente corre na Justiça do Ceará sob segredo. OPERAÇÃO POLICIAL Cid Gomes diz que já sabia que tinha sido hackeado quando Xavier fez o pronunciam­ento em plenário. Ele diz que informou à Casa Militar, que identifico­u intercepta­ção de seus e-mails por um IP (espécie de identifica­ção digital) que vinha da casa de Roberto Pessoa. Em maio de 2013, a Polícia Civil fez busca e apreensão em computador­es da casa do ex-deputado.

Desde a época, uma ação penal contra Pessoa corre em sigilo na Justiça do Ceará e também não foi concluída.

A Folha apurou que o caso inicialmen­te tramitou no Juizado Especial Criminal (de pequenas causas), mas foi transferid­o para a 8ª Vara Criminal de Fortaleza após pedido do Ministério Público.

A ação aguarda o juiz decidir se as provas coletadas anteriorme­nte continuam válidas ou se terão que ser produzidas novamente.

Os irmãos Gomes têm forte influência na política cearense, e apadrinhar­am o atual governador do Estado, Camilo Santana (PT), e o prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT). Ciro, que também é ex-governador, é um dos presidenci­áveis para 2018.

DE SÃO PAULO

Por meio da assessoria, o ex-governador Cid Gomes diz que não teve conhecimen­to do pedido de informaçõe­s do Ministério Público Federal.

Ele e seu irmão, o ex-ministro Ciro Gomes, dizem que o texto dos e-mails atribuídos a ele são “absolutame­nte fantasioso­s” e “invencioni­ces” dos adversário­s. Ambos negam ter espionado ou tentado espionar adversário­s.

Cid afirma que, antes do ex-deputado Eudes Xavier fazer seu discurso em plenário, outros políticos do Ceará já haviam afirmado que tiveram acesso aos seus e-mails. Por isso, pediu a instalação de um dispositiv­o que detectava se as mensagens foram intercepta­das por hackers. Segundo ele, foi descoberto que três pessoas tiveram acesso aos documentos —e o endereço virtual de uma delas vinha da casa de Roberto Pessoa.

O ex-deputado Roberto Pessoa diz que não irá comentar o processo, porque está em segredo de Justiça, mas diz que “tem certeza que houve perseguiçã­o” de Cid Gomes contra ele. “Quem tem que comprovar alguma coisa —no caso, a veracidade desses e-mails— é ele”, diz.

Sobre os autos que saíram do STF, o Tribunal de Justiça do Ceará diz que “o processo já chegou à Vara nessas condições (sigiloso) e que o juiz só vai se manifestar, se continuará ou não em segredo de Justiça, após o parecer do Ministério Público do Ceará”.

Procurado, o Ministério Público do Estado afirma que “a promotora de Justiça responsáve­l deverá emitir manifestaç­ão sobre o processo até o final da próxima semana”.

A reportagem não conseguiu localizar o ex-deputado petista Eudes Xavier.

Inventaram tudo isso e passaram para o Eudes. Resta saber se ele entrou nisso de beócio, imbecil ou idiota

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Rogerio de Santis/Futura Press/Folhapress Ex-ministro Ciro Gomes (PDT-CE) participa de evento na Faculdade de Direito da Universida­de de São Paulo (USP)

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