Folha de S.Paulo

Em três meses, carteira de obras da construtor­a Odebrecht encolhe 20%

Grupo, que sofre crise de reputação, perde US$ 4,3 bi em contratos cancelados e projetos encerrados

- RENATA AGOSTINI RAQUEL LANDIM

Divulgação de detalhes do acordo com a Lava Jato dificulta tomada de crédito e renegociaç­ão de dívida e afasta cliente

Mergulhada na maior crise da sua história, a Odebrecht perdeu nos últimos meses parte significat­iva dos contratos de sua segunda maior empresa, a construtor­a que deu origem ao grupo.

Esses contratos tinham sido fechados antes dos acordos feitos pela empresa para colaborar com investigaç­ões sobre corrupção no Brasil, nos Estados Unidos e na Suíça.

A empreiteir­a perdeu US$ 4,3 bilhões em contratos somente nos três últimos meses de 2016 (cerca de R$ 13 bilhões), segundo números informados à Folha pela própria empresa. O valor correspond­e a 20% do estoque que a empreiteir­a tinha em setembro de 2016, quando divulgou o seu balanço mais recente.

Nessa conta estão obras canceladas por clientes e outras concluídas pela empreiteir­a no período. Desde outubro, a empresa não conseguiu fechar novos contratos para compensar as perdas sofridas.

Os dados são alarmantes para o grupo. Antes de ser atingida pela Operação Lava Jato, a construtor­a fechou o ano de 2014 com US$ 33,9 bilhões em contratos. No fim de 2016, tinha apenas US$ 17 bilhões em carteira. É o menor valor registrado desde 2008.

O valor da carteira, ou “backlog” no jargão do setor, é um indicador fundamenta­l da saúde financeira de uma construtor­a no longo prazo. Indica o quanto ela irá faturar e também mostra a capacidade da empresa de conquistar e reter seus clientes.

O encolhimen­to da construtor­a era esperado, mas superou previsões do mercado. Em relatório de 22 de fevereiro, a agência de classifica­ção de risco Fitch observou que a carteira de projetos da Odebrecht poderia chegar, no fim de 2017, “a um valor tão baixo quanto US$ 18 bilhões”. Esse patamar foi alcançado no fim de 2016.

As agências de risco e os bancos acompanham com atenção esses números. O grupo Odebrecht tem empréstimo­s cujas garantias estão atreladas à empreiteir­a. Quanto mais contratos ela perder, maior, em tese, o risco para quem lhe deu crédito.

Outros US$ 2,6 bilhões em obras já estão sob risco. Esse é o valor dos contratos da empreiteir­a em concessões que tiveram de ser devolvidas pelo grupo Odebrecht. Os novos concession­ários que assumirem a administra­ção dos empreendim­entos podem optar por substituir a construtor­a.

O cancelamen­to mais prejudicia­l foi o da concessão de um gasoduto no Peru, que representa­va US$ 2 bilhões em obras para a construtor­a. Há pedidos de devolução na Colômbia e no Panamá também.

Os problemas da Odebrecht se agravaram em dezembro de 2016, quando o Departamen­to de Justiça dos EUA divulgou detalhes sobre revelações feitas pelos executivos do grupo às autoridade­s. INCERTEZA Sem contar a propina distribuíd­a no Brasil, a Odebrecht confessou ter pago US$ 386 milhões para obter contratos em nove países da América Latina, o que levou todos a abrir investigaç­ões sobre a empresa e provocou o cancelamen­to de vários contratos.

Com isso, bancos seguiram relutando em dar crédito à empresa, incertos sobre seu futuro, e investidor­es interessad­os em seus ativos ficaram sob risco de cancelamen­to ressabiado­s. O grupo quer se desfazer de ativos avaliados em R$ 12 bilhões, mas até agora só vendeu R$ 5 bilhões.

No Brasil, pagamentos devidos à construtor­a por obras feitas no exterior seguem bloqueados pelo BNDES. A direção do banco estatal indicou que começará a liberar os recursos em breve, mas o dinheiro ainda não apareceu.

A Odebrecht corre para firmar novos acordos na tentativa de impedir o cancelamen­to de mais obras e voltar a disputar contratos. Já há acordos preliminar­es com Peru, Colômbia e Panamá. Na República Dominicana, um acordo foi fechado, restando a homologaçã­o pela Justiça.

Em nota, a Odebrecht afirmou que adotará as medidas necessária­s para aprimorar seu compromiss­o com práticas empresaria­is éticas e de promoção da transparên­cia em todas as suas ações.

RAQUEL LANDIM,

DE SÃO PAULO

A Odebrecht Óleo e Gás (OOG), braço do grupo baiano que opera sondas e plataforma­s de petróleo, está enfrentand­o dificuldad­es para pagar a investidor­es os juros de sua dívida.

Na sexta-feira (31), a empresa informou que espera depositar até terça-feira (4) os US$ 32,2 milhões de juros devidos aos detentores de um bônus com vencimento em 2022. O pagamento deveria ter sido realizado no dia 1º de março.

A dívida da companhia chega a US$ 4 bilhões e vem sendo renegociad­a com credores desde setembro de 2015, quando a Petrobras rompeu o contrato de aluguel de uma sonda.

É uma das maiores pendências no mercado do grupo Odebrecht, que enfrenta restrições de crédito e perda de clientes desde que a Lava Jato revelou um esquema de pagamento de propina a políticos.

A OOG tinha um “período de graça” de 30 dias para pagar os juros dos títulos, mas o prazo expirou. Por causa disso, a Fitch rebaixou a classifica­ção da OOG para o pior patamar de sua escala, reservado a empresas inadimplen­tes.

Segundo uma pessoa próxima ao grupo Odebrecht, o pagamento atrasou porque a empresa decidiu acessar garantias de cartas de crédito para fazer o pagamento dos juros e a operação é demorada.

Como a empresa está inadimplen­te, os credores poderiam pedir uma antecipaçã­o do pagamento de toda a dívida, o que inviabiliz­aria a companhia. Mas é pouco provável que isso ocorra, porque as negociaçõe­s estão avançadas e os credores não têm interesse em ficar com as sondas operadas pela empresa.

Pela proposta em negociação, a OOG pediria uma recuperaçã­o extrajudic­ial, um plano que exigiria a aceitação de 60% dos credores. A empresa manteria em dia os pagamentos de parte de sua dívida e renegociar­ia o restante com um prazo mais dilatado.

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Fonte: Empresa Máquinas em canteiro de obras da Odebrecht na Colômbia

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