‘Tuitaços’ e jovens evangelizadores impulsionam Bolsonaro nas redes
Apoiadores organizam postagens para colocar deputado entre principais assuntos da internet
Parlamentar centraliza apoios na extrema direita, diz pesquisador da Universidade Federal do Espírito Santo
“Digamos que as eleições fossem hoje. A gente sabe que Bolsonaro não teria espaço”, prevê o universitário Raul Holderf, de 19 anos. “Não é de partido grande, não tem coligação, não tem tempo de rádio e TV. Nosso prazer é inverter isso, saber que o que acreditamos está ganhando voz.”
A um ano do calendário eleitoral, apoiadores de Jair Bolsonaro (PSC-RJ) já estão enfileirados para a disputa nas redes sociais. Com organização militar e vocação evangelizadora, organizam “tuitaços” (postagens em massa no Twitter) para promover o deputado federal —sobretudo quando o clima não o favorece.
Em 7 de março, o Supremo Tribunal Federal manteve ação contra o parlamentar, acusado de estupro ao ofender a deputada Maria do Rosário. A tag #BolsonaroReidoMundo circulou por três dias —16 horas no topo no dia 8.
De acordo com a ferramenta Trendinalia, Bolsonaro esteve 23 vezes nos trending topics do Brasil desde 1º de fevereiro. Nenhum dos cotados à Presidência chega a esse patamar, sobretudo com uma base organizada.
Segundo Fabio Malini, coordenador do laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), as redes no Brasil, sobretudo o Twitter, se dividem em três grandes grupos.
Bolsonaro é protagonista da extrema direita. Há o “grupo do Ministério Público”, diz Malini, que defende as “Dez Medidas contra a Corrupção” e a Lava Jato, “com participação forte de procuradores como o [Deltan] Dallagnol”. E a esquerda, em torno de Lula.
Bolsonaro chegou a 9% das intenções de voto na última pesquisa Datafolha, em dezembro. SEGURANÇA Raul Holderf comanda um dos principais grupos próBolsonaro na rede, o @conexaopoIitica, com “viés cristão, conservador, de direita”.
O jovem é o criador do perfil, que administra com amigos de quatro Estados e tem 3.500 seguidores. Em cinco dias, publicaram 314 tuítes, retuitados 2.900 vezes e “curtidos” por 5.900 usuários.
Malini, da Ufes, monitora Bolsonaro e outros políticos nas redes desde 2013. Coletou esses dados durante uma semana de fevereiro, a pedido da Folha: total de 54 mil tuítes.
O quarteto do Conexão Política está na casa dos 20 anos. Por WhatsApp, planejam os tuitaços com uma semana de antecedência. Na véspera, publicam o horário e a “hashtag”.
Estudante de letras, Holderf mora em Abreu e Lima (PE) e conheceu Bolsonaro quando precisou fazer um trabalho de escola, em 2011, sobre políticos do Sudeste.
O jovem é evangélico. Se identifica com as ideias sobre a segurança, como a defesa de que brasileiros possam andar armados, uma bandeira do ex-militar. “A casa onde eu moro foi assaltada cinco vezes no último ano”, diz.
São razões parecidas com a de seu colega Henrique Speck, 20, de Marechal Rondon (PR): “Vi uma declaração dele na TV, achei legal e fui buscar mais. Era sobre penas mais pesadas para bandidos. Hoje, os cidadãos de bem são reféns.”
Um dos usuários pró-Bolsonaro mais ativos atende por @SorataStandz. Misturando #SomosTodosBolsonaro com imagens de desenhos japoneses pornô, consegue fazer seis postagens em um só minuto.
O ritmo sugere que o perfil seja um robô —como a maioria da rede em torno do deputado, estimam especialistas em marketing político digital.
Indícios: o usuário é monotemático e publica em padrões sobreumanos. Segundo o Twitter, também “um grande número de respostas ou menções duplicadas” e “várias atualizações não relacionadas” a um tema.
“Robôs criam a sensação de que todo mundo está falando uma coisa. É o que os políticos estão buscando”, diz Fabrício Benvenuto, professor do curso de Ciências da Computação da UFMG.
É impossível saber quem controla os autômatos. Podem ser “indivíduos, organizações e mesmo governos”, diz Emilio Ferrara, pesquisador da Universidade da Califórnia — ele constatou que 1 em 5 postagens política nas eleições americanas vinha de robôs.
Bolsonaro diz não ter relação com os tuitaços, mas os aprova. “A leitura que faço é a satisfação do dever cumprido”, diz. Seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) cuida do Twitter —ele mesmo só trabalha “com o Facebook, apenas”.