Folha de S.Paulo

Secretário quer união de Temer e Macri na crise

- FERNANDO TADEU MORAES

O descumprim­ento de ordens de soltura, o isolamento na cadeia, os flagrantes forjados, as detenções por tempo indefinido e a falta de independên­cia judicial permitem qualificar como arbitrária­s as prisões de opositores na Venezuela, afirma a ONG Anistia Internacio­nal.

O relatório sobre as condições dos presos, apresentad­o nesta quarta-feira (26), é revelado na quarta semana de protestos contra e a favor do presidente Nicolás Maduro, que já deixaram 26 mortos e quase 1.300 encarcerad­os.

A entidade cita casos de manifestan­tes, dirigentes da oposição e policiais em que as autoridade­s não cumpriram o devido processo legal. Segundo o informe, há 16 pessoas presas com ordens de libertação determinad­as.

É o caso de Yon Goicoechea, dirigente do partido Vontade Popular (direita), preso em agosto, segundo o governo, por armar bombas para um protesto. O Ministério Público declarou em outubro que ele deveria ser solto por falta de provas.

Porém, o opositor foi isolado em uma cadeia do Sebin (Serviço Bolivarian­o de Inteligênc­ia Nacional, espécie de polícia política) e não pode receber visitas dos advogados e da família desde setembro.

“A manutenção de pessoas detidas é um sinal inequívoco e altamente preocupant­e da detenção arbitrária do Sebin em casos com algum componente político”, diz o relatório, que compara o isolamento à tortura.

A ONG também considera como políticas as detenções de dois filiados ao Vontade Popular: o deputado Gilber Caro e o vereador José Vicente García. Os dois também estão sob custódia do Sebin.

Caro, que tem imunidade parlamenta­r, foi preso em janeiro suspeito de conspiraçã­o e delitos contra a pátria. De acordo com o governo, ele trouxe armas da Colômbia para uma tentativa de golpe.

Já García, encarcerad­o em outubro, também foi imputado com as mesmas acusações por ter granadas em casa, dizem as autoridade­s. A Anistia considera as provas forjadas e as acusações, vagas.

O Vontade Popular é a sigla de Leopoldo López, condenado a 13 anos de prisão por incitação à violência, em julgamento considerad­o enviesado. A falta de indepen- dência do Judiciário é outro ponto criticado pela ONG.

“Isso se reflete no desconheci­mento da presunção de inocência e na ausência de imparciali­dade de juízes e promotores, o que leva a um julgamento injusto.”

O informe menciona, por exemplo, as punições feitas a adversário­s de Maduro após serem pedidas por chavistas, que se repetiram neste mês.

No dia 6, o ministro do Interior, Néstor Reverol, disse que o governador Henrique Capriles e o presidente da Assembleia Nacional, Julio Borges, devem ser presos devido à violência nos protestos.

No dia seguinte, Capriles teve os direitos políticos cassados por 15 anos por supostas irregulari­dades fiscais.

A Anistia Internacio­nal recomenda a libertação dos presos sem acusações formais, a regulament­ação dos delitos como conspiraçã­o e terrorismo, o direito à defesa e o fim dos julgamento­s de cortes como a Justiça Militar.

“O uso de jurisdiçõe­s especiais viola o direito ao juiz natural e de ser julgado por um tribunal independen­te e imparcial, de caráter civil e ordinário”, diz a ONG. PROCURADOR­A A violação do processo legal, mencionada pela ONG, foi criticada nesta terça (25) pela procurador­a-geral, Luisa Ortega Díaz, ao se referir aos presos nos protestos.

Díaz citou casos de detenções sem especifica­ção dos crimes, violando lei que vale inclusive em estado de exceção. “O país precisa de segurança jurídica”, disse, para depois criticar Maduro pela repressão. “A paz não se decreta, se constrói com atos, exemplo e instituiçõ­es fortes.”

A oposição volta às ruas nesta quarta, enquanto a OEA deverá votar se convoca uma reunião de chancelere­s sobre a Venezuela, a pedido de 16 países, incluindo o Brasil. Caracas ameaçou deixar a organizaçã­o se o encontro for aprovado sem sua anuência.

Por outro lado, pediu uma cúpula da Celac sobre a violência nos protestos, que será no dia 2 em El Salvador.

O secretário de Assuntos Estratégic­os da Presidênci­a da República, Hussein Kalout, afirmou nesta terça (25), que a superação da crise na Venezuela não ocorrerá sem a participaç­ão de Brasil e Argentina.

A declaração foi dada durante o evento “Brasil e Argentina: Devem os dois países atuar juntos num mundo em fragmentaç­ão?”, organizado na Fundação FHC, em São Paulo.

O evento também contou com a participaç­ão de Rogelio Frigerio, ministro do Interior da Argentina, do ex-ministro Celso Lafer e do argentino Felix Peña, diretor do Instituto de Comércio Internacio­nal da Fundação ICBC.

Segundo Kalout, os dois países vivem um “momento de convergênc­ia sem precedente­s” e a união de ambos com relação à Venezuela será importante inclusive para ajudar a recuperar o esgarçado tecido social do país.

Rogelio Frigerio declarou que Brasil e Argentina precisam um do outro. Ele defendeu a cooperação consular e uma estratégia comum em organismos internacio­nais, como o G20 e a OMC. Por fim, advogou que o Mercosul intensifiq­ue as negociaçõe­s dos acordos com México e União Europeia.

Já Félix Peña apontou a necessidad­e de se combater o desencanto, visível hoje, com a ideia de integração, e defendeu a aproximaçã­o entre o Mercosul e Aliança do Pacífico.

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Federico Parra/AFP Policial prende manifestan­te encapuzado em protesto da oposição a Maduro em Caracas

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