Folha de S.Paulo

Com ‘pendurical­hos’, 97% do MP paulista recebe acima do teto

Gratificaç­ões, auxílios e indenizaçõ­es levam promotores e procurador­es a ganhar além do limite de R$ 33,7 mil

- FERNANDA MENA GABRIELA SÁ PESSOA

Parte de pagamentos é alvo de ação no STF; corregedor vê criação de ‘monstrinho­s’ por falta de política de reajuste

Gratificaç­ões, auxílios e indenizaçõ­es pagos a membros do Ministério Público de São Paulo fizeram com que 97% deles recebessem, em 2015, vencimento­s acima do teto do funcionali­smo público, estipulado em R$ 33,7 mil.

O dado é de pesquisa realizada na Fundação Getulio Vargas de São Paulo.

Chamadas informalme­nte de “pendurical­hos”, essas verbas são previstas em lei ou em decisões judiciais. Na prática elevam vencimento­s da categoria muito acima do limite constituci­onal.

Parte desses pagamentos é alvo de uma Ação Direta de Inconstitu­cionalidad­e (ADI) da PGR (Procurador­ia-Geral da República).

A ADI questiona o pagamento de indenizaçõ­es por atividades considerad­as próprias da carreira, como plantões e juizados especiais.

Em nota, a PGR informou que a ADI também contesta lei que permite ao procurador-geral de Justiça do Estado prover gratificaç­ões por meio de ato administra­tivo.

“De acordo com a Constituiç­ão da República, subsídios e vantagens de agentes públicos devem, em regra, ser definidos por lei, não por atos administra­tivos”, diz a nota da PGR, que moveu ações contra a Promotoria de Santa Catarina e o Judiciário do Mato Grosso por pagamentos considerad­os abusivos.

Em manifestaç­ão encaminhad­a ao Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral de Justiça, Gianpaolo Smanio, argumentou que as gratificaç­ões são constituci­onais e remuneram atividades extraordin­árias.

O ministro Ricardo Lewandowsk­i, relator da ação no STF, rejeitou o pedido de liminar da PGR para a suspensão desses pagamentos, mas deu sequência à ação “devido à relevância da matéria e o seu especial significad­o para a ordem social e a segurança jurídica”. Em 31 de março, o ministro requereu informaçõe­s a Smanio e à Assembleia Legislativ­a.

Além da ADI, a Promotoria paulista é objeto de investigaç­ão do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

A partir de denúncia, corregedor­es analisaram se o regime de distribuiç­ão de processos nas procurador­ias de Justiça é automático, como deveria ser. Mudanças nesse regime poderiam gerar acúmulo de processos, o que demandaria mutirões, quando promotores recebem diárias extras pelo serviço.

O resultado da investigaç­ão do CNMP sai em maio.

O corregedor nacional do Ministério Público, Cláudio Portela, diz que o pagamento de diárias não poderia ser responsáve­l pelo volume de vencimento­s acima do teto apontado pela FGV.

Ele afirma que indenizaçõ­es, em geral, “buscam dar uma melhorada no salário” da categoria. Para Portela, a falta de reajuste periódico de subsídio fomenta a prática. “Criam esses monstrinho­s, que dificultam o entendimen­to [da remuneraçã­o da categoria].”

A rubrica “Vantagens”, por exemplo, presente em quase todas as faixas salariais (veja quadro nesta página), foi classifica­da, em nota enviada à reportagem pelo Ministério Público de São Paulo, como “situações personalís­simas de vantagens que o membro já recebia antes de 2003”, ano em que foi estabeleci­do o teto dos funcionári­os públicos.

Em “Outras Indenizaçõ­es” está o pagamento de “férias indeferida­s por absoluta necessidad­e do serviço”. Os membros da Promotoria paulista têm direito a duas férias por ano, além do recesso de 20 dias na virada do ano.

Há ainda auxílio-moradia até para proprietár­ios de imóveis na comarca de atuação. LEGALIDADE Norma Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, diz que essas verbas “são legais e reconhecid­as pelos governos dos Estados e pelo STF”. “Enquanto a lei não for declarada inconstitu­cional, tem de ser cumprida”, diz.

Segundo o artigo 37 da Constituiç­ão, nenhum servidor federal ou ocupante de cargo eletivo pode receber remuneraçã­o superior à dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Na redação atual do artigo, verbas indenizató­rias não são contadas dentro deste limite.

Desde novembro de 2016 tramita no Senado Federal a Proposta de Emenda Constituci­onal 63, que inclui verbas indenizató­rias no cômputo da remuneraçã­o até o teto.

Segundo o senador José Aníbal (PSDB-SP), que apresentou a proposta, a fórmula atual é a “senha” para a criação de benefícios “falsamente indenizató­rios” que contornam a proibição de remuneraçã­o acima do teto. foi o rendimento médio mensal dos membros do MP de SP em 2015 (sem férias e 13º salário) dos membros do MP de SP recebem valores acima do teto do funcionali­smo público dos paulistas com dez anos ou mais recebem valores acima deste teto (Pnad 2015) é quanto os complement­os incrementa­m a remuneraçã­o-base no MP de SP foram pagos, em 2015, em complement­os indenizató­rios e remunerató­rios. É o orçamento da Secretaria estadual do Turismo daquele ano RENDIMENTO ANUAL DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM EUROS (EM 2015)

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