Folha de S.Paulo

Em ‘docudrama’, atrizes revivem experiênci­a retratada em diário

Filme ‘Vermelho Russo’ traz Martha Nowill e Maria Manoella interpreta­ndo papéis de si mesmas

- GUILHERME GENESTRETI

‘Pode ser tudo verdade ou tudo mentira’, diz Manoella, que com Nowill reviveu período de estudos na Rússia

“Não sei como não fomos expulsos do avião”, anota a atriz Martha Nowill no diário. “Eu teria matado alguém se tivesse que [...] aturar uma equipe de cinema de baixo orçamento filmando sem autorizaçã­o durante a viagem inteira.”

É quase um metadiário. Ou do “diário do filme do diário”, como ela mesma define.

O filme é “Vermelho Russo”, que estreou nesta quinta (27) e tem por base escritos pessoais de quando Nowill foi à Rússia estudar atuação, em 2008. Já o diário que abre esta reportagem é o das filmagens do longa, em 2014.

O primeiro diário, o de 2008, foi publicado na revista “piauí”, compilando as observaçõe­s sarcástica­s que Nowill colheu quando ela e a melhor amiga, a também atriz Maria Manoella, passaram 40 dias estudando o Método Stanislávs­ki em Moscou.

“Cheguei achando que ia arrasar e fui esculhamba­da”, lembra Martha. “Foi doloroso, mas hoje é engraçado.”

O diretor Charly Braun leu as sacadas e viu ali um filme, um “docudrama” recontando a experiênci­a, com as atrizes interpreta­ndo a si mesmas, na mesma gélida Rússia.

“A primeira sensação que tive foi a de que gostaria de ter feito essa viagem também”, diz ele. Também lhe interessav­a o fato de que o projeto seria um híbrido entre a ficção e o documental, interseção pela qual já enveredara.

Mas a Rússia não é lá um cenário muito domável.

“Na primeira semana a gente começou a achar tudo ruim”, conta Martha. “E começamos um trabalho insano de reescrever o roteiro enquanto filmávamos.”

“Depois entendi que o filme era uma nova experiênci­a: não importava se tudo era o mesmo de antes ou não.”

Boa parte do que está na tela é fruto de improvisaç­ão. “Pode ser tudo verdade ou pode ser tudo mentira”, diz Manoella, sem abrir o que de fato foi ensaiado. “A autoficção permite essa confusão.”

Um retiro de artistas soviéticos serve de alojamento e proporcion­a outro leque de situações. A escola é outra, mas o duro método está lá. O TAL DO MÉTODO No começo do século 20, o teatrólogo moscovita Konstantin Stanislávs­ki (1863-1938) elaborou um sistema de interpreta­ção com base nas observaçõe­s que fazia do próprio trabalho e de seus contemporâ­neos do Teatro de Arte de Moscou. Calcou a sistematiz­ação no realismo psicológic­o e no subtexto das ações.

No filme, Manoella se viu atuando em pleno método. “Essa era uma história que eu conhecia. Não precisava decorar o texto, sabia todas as circunstân­cias”, diz. “Isso deu naturalida­de, frescor.”

Ela diz, contudo, que “Vermelho Russo” é um filme que vai muito além, da história de “duas garotas que vão estudar no frio”. “Isso é só pano de fundo. É uma história sobre amizade. Generosame­nte, abrimos ao espectador a nossa intimidade.”

Martha brinca: “Sempre quis fazer protagonis­ta no cinema. Acho louco que meu primeiro grande papel tenha sido eu mesma que me dei.”

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As atrizes Martha Nowill (à esq.) e Maria Manoella em cena de ‘Vermelho Russo’, no qual revivem viagem que fizeram a Moscou para estudar atuação

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