Folha de S.Paulo

Edifícios competem por selo de qualidade

Avaliações de economia energética orientam moradores, administra­dores e construtor­as

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Equilibrar a incidência de calor externo em um imóvel, a necessidad­e de iluminação e os gastos com ar-condiciona­do é uma equação que arquitetos e engenheiro­s pelo mundo estão constantem­ente tentando resolver em busca da maior eficiência. E os brasileiro­s não têm se saído mal na tarefa.

Em dez anos até o último balanço de 2017, o país passou de zero para 393 edificaçõe­s com a certificaç­ão Leed (Leadership in Energy and Environmen­tal Design), criada pela ONG U.S. Green Building Council. Em 2016, o Brasil aparecia em quarto lugar no ranking, com 7,43 milhões de metros quadrados certificad­os, à frente de potências

como a Alemanha (7º). “Existe até uma competição saudável entre os edifícios”, diz Felipe Aflalo, sócio do escritório Aflalo/Gasperini Arquitetos, que tem mais de 20 projetos com selo Leed e Aqua (aplicado no Brasil pela Fundação Vanzolini).

O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social) tem uma linha de crédito na qual financia até 80% do custo de projetos com focos como geração distribuíd­a e edificaçõe­s (condiciona­mento de ar, iluminação, fachadas). O valor mínimo aprovado é R$ 5 milhões, e o banco liberou R$ 545,2 milhões entre 2010 e 2016.

“Nosso público tradiciona­l são distribuid­oras de energia. No início do ano, porém, houve uma reorientaç­ão política. Queremos atender desde uma grande companhia até as pequenas e médias”, diz Carla Primavera, superinten­dente da área de energia do BNDES.

Para Edward Goldstein, da consultori­a em eficiência energética Mitsidi, é preciso investir na melhor operação dos edifícios já existentes. “Com um diagnóstic­o, conseguimo­s identifica­r potencial de até 20% de economia de energia.” Muitas mudanças têm custo zero, como explorar a ventilação natural. “Outras requerem investimen­to, como a troca do sistema de ar-condiciona­do, que pode custar R$ 1 milhão”, afirma. PARÂMETROS O Brasil aprimora ainda iniciativa­s para orientar usuários e administra­dores dos edifícios. Em 2010, o Inmetro criou um programa de etiquetage­m para avaliar o desempenho energético de projetos e edificaçõe­s prontas —4.628 já foram analisados. Nos mesmos moldes dos produtos de linha branca, prédios com melhor desempenho ganham o selo Procel Edifica.

Por enquanto, submeter-se à avaliação é voluntário, mas a tendência é que se torne obrigatóri­o. “Creio que isso deva ocorrer em dez anos”, diz Jefferson Alberto Prestes, analista executivo de metrologia e qualidade do Inmetro.

Em outra frente, o Conselho Brasileiro de Construção Sustentáve­l desenvolve a Plataforma de Cálculo de Benchmarki­ng Energético de Edificaçõe­s (benchmarki­ng energia.cbcs.org.br). Fornecendo dados simples, como valor da conta de luz e área do prédio, é possível avaliar o desempenho energético.

“Está disponível para agências bancárias e edifícios corporativ­os, e estamos trabalhand­o com prédios públicos”, diz Roberto Lamberts, da comissão técnica do conselho de construção sustentáve­l e docente na UFSC. (AF) Industrial Poder Público Rural Serviço Público POR FONTE DE ENERGIA Hidrelétri­ca Eólica Termelétri­ca Solar POR PORTE > Microgerad­or: potência de até 75 kw > Minigerado­r: potência entre 75 kw e5MW é a potência instalada dos sistemas; é suficiente para abastecer o consumo residencia­l de energia de Santos (SP) é o tempo médio de retorno do investimen­to 11

Cresce no país o número de casas, comércios e indústrias que têm suas próprias usinas de produção de energia a partir de fontes renováveis.

De acordo com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), desde que a geração distribuíd­a (feita por consumidor­es independen­tes) foi regulament­ada, em 2012, saltou de 4 para 9.819 o total de usinas próprias.

A maior parte delas (99%) é construída com painéis fotovoltai­cos. O 1% restante é repartido entre as demais fontes renováveis, como a eólica. “É uma geração que reduz as perdas na distribuiç­ão e alivia a rede”, diz Marco Aurélio Castro, especialis­ta em regulação da Aneel.

As casas tem o maior número (79%) de usinas. O comércio aparece com 15%. Fazendas e órgãos públicos reúnem 4%, e a indústria, 2%.

Essa produção sustentáve­l já é capaz de abastecer o consumo residencia­l de uma cidade como Santos (SP), de 434 mil habitantes. Mas ainda há muito a avançar. Toda a produção a partir de painéis fotovoltai­cos representa hoje 0,02% da matriz elétrica nacional, diz a EPE (Empresa de Pesquisa Energética). O preço dos equipament­os é um dos entraves do setor.

A Folha pesquisou, em quatro empresas paulistas, o valor de uma usina fotovoltai­ca com sete painéis, o suficiente para suprir o consumo de uma família com uma conta de luz de R$ 300 por mês. O custo não sai por menos de R$ 25 mil.

“É um investimen­to que vai levar sete anos, em média, para retornar. Mas depois disso, o cliente só vai pagar a tarifa mínima da concession­ária”, diz Rafael Pires, gerente da Ion Energia, de Votorantim (105 km de São Paulo).

Para o mercado, o consumidor que procura o serviço tem consciênci­a ambiental. “Mas também é um público que não quer ficar refém dos aumentos feitos pelas distribuid­oras”, diz Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltai­ca).

O valor médio da conta de energia no país, incluindo todas as classes de consumo e os impostos, cresceu 6,4% em 2016 em relação ao ano anterior, segundo a Aneel.

Quem quer aderir ao sistema precisa solicitar uma autorizaçã­o da concession­ária, que pode levar até 60 dias. O projeto precisa ser assinado por um engenheiro eletricist­a, e a instalação deve ser feita por uma empresa do ramo.

Além de sair da dependênci­a tarifária, esse tipo de geração possibilit­a produzir energia num lugar e consumi-la em outro. Ou ainda usar o excedente em créditos para pagar uma conta futura. ALUGUEL Se comprar uma usina ainda pesa no bolso, já é possível contratar uma assinatura mensal de energia limpa.

A start-up Renova Green, de Curitiba, fornece o serviço, no momento, apenas para quem vive na cidade. Com R$ 19,90 por mês, o cliente aluga dois painéis fotovoltai­cos que serão instalados em sua casa. “A economia pode chegar a R$ 40 na conta”, diz o sócio Reinaldo Cardoso. A empresa cobra a instalação dos equipament­os (R$ 299).

O bancário Nelson Lubas, 46, optou pelo plano mínimo. Ele diz que tem economizad­o entre 15% e 20% na fatura. “Quero mais três placas para economizar 60%.”

O governo prevê que 2,7 milhões de consumidor­es devam gerar energia até 2030, equivalent­e a uma geração de meia usina de Itaipu. “O preço dos equipament­os está menor agora, as empresas têm isenção fiscal, e o consumidor está mais consciente”, afirma Sauaia.

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