ANÁLISE Morte completa ciclo iniciado com suicídio de Kurt Cobain
O ex-vocalista do Soundgarden e do Audioslave, morto horas após um show em Detroit, nos EUA, era uma das quatro maiores vozes do último movimento realmente relevante para renovar o rock.
Sua morte completa um ciclo triste e violento iniciado com o suicídio de Kurt Cobain, em 1994, aos 27 anos.
Dois eixos marcam essa extinção forçada do grunge: a relação autodestrutiva com as drogas, em especial a heroína, e o trato desconfortável e antagônico com o sucesso.
A alienação face aos holofotes foi compreensível a uma geração que, ainda que de forma descoordenada, enterrou uma era de excessos, ilustrada à caricatura pelo rei deposto Axl Rose, do Guns N’ Roses.
Kurt Cobain foi o primeiro. Alçado a líder da onda e antípoda do modelo de rock star, o líder do Nirvana se matou com um tiro na cabeça, em 1994, aos 27. Enfrentava depressão e vício em heroína.
Depois foi Layne Staley, o macambúzio líder do Alice in Chains, em 2002, aos 34, quatro anos após sua última aparição pública. Seu corpo foi encontrado em casa semanas após o que as autoridades creem ter sido uma overdose de heroína e cocaína.
Em 2015, Scott Weiland seguiu os macabros receituários autodestrutivos do rock e morreu, também de overdose —de cocaína e remédios, após décadas de luta contra o vício em heroína e álcool—, em um ônibus de turnê.
Ele tentava se reerguer após saídas nada amigáveis do Stone Temple Pilots e do Velvet Revolver, formado pelos então ex-Guns N’ Roses Slash e Duff McKagan.
Dono da voz mais virtuosa entre eles, Cornell foi um dos primeiros a tentar pular do barco do niilismo, embora tenha flertado com o vício, em particular com o álcool.
Saudável, teve tempo de fazer sucesso de novo com outra banda, o Audioslave. Nos últimos anos, empreendeu bem-sucedida carreira solo, entre o rock e o pop e arriscando-se em outras searas.
Não deixa de ser sintomático que Weiland e Cornell tenham deixado o palco da vida já no início da velhice e em uma era em que o gênero agoniza pela própria irrelevância —em especial nos EUA, onde o hip-hop e o pop alçaram rappers e divas aos postos de porta-vozes antes ocupados por roqueiros cabeludos.
Também é sintomático que deste time tenha sobrado Eddie Vedder. O cantor do Pearl Jam —há 27 anos com a banda— nunca foi um junkie, ao menos não como os colegas, e desde cedo ultrapassou os limites mórbidos desta cena.
Como que fechando um ciclo soturno, vale lembrar que o próprio movimento grunge foi catalisado por uma morte: a de Andrew Wood, cantor do Mother Love Bone, em 1990.
Em homenagem ao amigo morto, Cornell recrutou colegas músicos para uma bandatributo, o Temple of the Dog.
Fãs de Pearl Jam reconhecerão a formação deste efêmero conjunto: os guitarristas Stone Gossard e Mike McCready, o baixista Jeff Ament e o baterista Matt Cameron.
Eles mesmos, membros do Pearl Jam, então à procura de uma voz. Conheceram, na ocasião, um jovem cantor que havia viajado a Seattle para teste em outro grupo: Vedder.
O resto é história e, esperase, ainda ganhará tintas. Mas, só por garantia, alguém por favor coloque Eddie Vedder em um local seguro.