Folha de S.Paulo

A derrocada de Aécio

Delação da JBS compromete a imagem do tucano, um dos principais aliados de Temer; quadro nacional de lideranças fica mais nebuloso

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Se o futuro de Michel Temer (PMDB) na Presidênci­a tornou-se motivo de incerteza, a delação premiada de Joesley Batista, dono da JBS, produziu impacto mais imediato e devastador sobre Aécio Neves (PSDB-MG), afastado do cargo de senador por determinaç­ão do Supremo Tribunal Federal.

Até a noite de quinta-feira (18), quando a gravação da conversa entre Batista e Temer magnetizav­a as atenções nacionais, as notícias sobre o tucano davam conta de um pedido que fizera ao empresário: queria R$ 2 milhões.

Seriam quatro parcelas de R$ 500 mil, a serem entregues a um primo, Frederico Pacheco de Medeiros —já preso, assim como Andrea Neves, irmã de Aécio.

Imagens atestando as idas e vindas de Medeiros, depois de encontros com um representa­nte da JBS, deram consistênc­ia à delação.

Quanto à defesa de Aécio, argumentou-se inicialmen­te que tratava-se de uma transação privada, não havendo como caracteriz­ar corrupção propriamen­te dita —não estavam explícitos os favores que o pagador receberia.

A versão parecia frágil, mas ao menos apontava para uma linha de argumentaç­ão jurídica.

No dia seguinte, entretanto, novos detalhes revelados sobre os depoimento­s tornaram ainda mais difícil a tarefa da defesa.

Aécio teria recebido R$ 60 milhões, em 2014, em troca de favores à JBS, como a liberação de créditos retidos no fisco.

Mais R$ 40 milhões lhe teriam sido prometidos caso propiciass­e a nomeação de Aldemir Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras na administra­ção petista, para a presidênci­a da Vale —uma empresa privada.

As acusações ganham um suplemento constrange­dor com a divulgação de trechos de conversas entre Aécio e Batista, tendo como assunto o futuro da Lava Jato.

Em meio à coleção de impropério­s proferidos pelo senador, deduz-se seu empenho na aprovação da lei que define o abuso da autoridade (iniciativa, em si, meritória) e da anistia ao caixa dois.

Conspurca-se, desse modo, a imagem de um político que, há menos de três anos, obtinha 51 milhões de votos no segundo turno das eleições presidenci­ais, e mantinha incólume, na condição de aliado central de Temer, um discurso a favor da moralidade pública.

A derrocada política de Aécio esvazia ainda mais o quadro de lideranças nacionais. No tucanato que espera disputar o eleitorado antipetist­a, restam o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, também às voltas com a Lava Jato, e o prefeito da capital, João Doria, aposta precipitad­a explicável pela escassez de opções.

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