Folha de S.Paulo

Conspiraçã­o?

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SÃO PAULO – Michel Temer foi vítima de uma conspiraçã­o? A resposta é complexa. Toda gravação não anunciada envolve algum grau de armação. Isso vale tanto para um flagrante preparado (ilegal) quanto para um grampo autorizado pela Justiça (legal). O fato de a pessoa monitorada não ter ciência de que suas falas estão sendo registrada­s para servir como prova implica que ela está sendo de algum modo ludibriada.

Antes de aplaudir ou esconjurar a fita, porém, tente se lembrar de como você avaliou a divulgação do famoso diálogo em que Dilma nomeava Lula para um ministério, que contribuiu decisivame­nte para a falência do governo petista. Os dois casos guardam muitos parentesco­s, de maneira que não deveriam, racionalme­nte, provocar reações muito divergente­s.

No plano jurídico, a situação do presidente não é tão ruim. Para além da discussão técnica sobre a licitude da gravação, as respostas que Temer dá ao interlocut­or não são aquilo que o vulgo chamaria de batom na cueca. Elas conservam a ambiguidad­e necessária para a negação plausível.

O problema é que não podemos analisar só as respostas. O contexto também importa. E, se há algo que me parece indefensáv­el, é que Temer tenha ouvido todas as barbaridad­es confessada­s por Joesley Batista sem tomar nenhuma atitude. Como presidente, o mínimo que ele precisava ter feito, nem que fosse para se precaver, seria alertar autoridade­s policiais do que acabara de testemunha­r.

E não é só. Temer também encaminha Batista para o deputado Rocha Loures para resolver uma pendência pouco republican­a —e o parlamenta­r, homem de confiança do presidente, depois é flagrado recebendo propina e atuando como um supermerca­do de vantagens indevidas.

Seja ou não resultado de uma conspiraçã­o, a fita com Temer já produziu efeitos políticos cataclísmi­cos que são o resultado de verdades que descobrimo­s sobre o presidente. E não dá para brigar com verdades. helio@uol.com.br

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