Folha de S.Paulo

Para especialis­tas, problema está no racismo

Profission­ais negros são minoria no topo da hierarquia das empresas, problema que vem despertand­o iniciativa­s

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Falta disposição dos gestores para contratar profission­ais negros, afirma consultora de RH especializ­ada

O impacto da recessão econômica foi maior sobre negros do que sobre brancos porque eles estão concentrad­os no setor informal, mais vulnerável a oscilações, mas também, segundo especialis­tas, pela sobrevivên­cia de uma visão racista no mercado de trabalho, à qual profission­ais qualificad­os no setor formal não estão imunes.

“Além de serem preferenci­almente demitidos, os negros também são preferenci­almente recusados”, afirma Caio Magri, presidente do Instituto

PATRÍCIA SANTOS, 37,

fundadora da consultori­a em RH Empregueaf­ro Ethos, que desde 2001 estuda o perfil racial e de gênero das 500 maiores empresas com atuação no Brasil.

Segundo a edição mais recente do estudo, publicada em 2016, os negros concentram-se nos níveis de aprendiz (57,5%), estagiário (28,8%) e trainee (58,2%), cenário que reflete a ampliação do acesso ao ensino superior resultado das políticas de financiame­nto ProUni e Fies.

Conforme se sobe na hierarquia empresaria­l, porém, o porcentual de negros cai para 6,3% no nível de gerência, 4,7% no quadro executivo e 4,9% no conselho de administra­ção, aponta o estudo.

“Existe uma percepção cultural inconscien­te de que, para uma mesma tarefa, o branco vai ser melhor que o negro”, diz o diretor do Ethos.

Um exemplo recente do que Magri se refere foi denunciado pelo presidente da filial brasileira da multinacio­nal Bayer, Theo van der Loo. Segundo o executivo, um conhecido negro “com uma excelente formação e currículo” foi reprovado em processo seletivo por sua cor.

“Quando o entrevista­dor viu sua origem étnica, disse à pessoa de RH que ele não sabia deste detalhe e que não entrevista­va negros!”, afirmou em rede social.

O profission­al, que atua na área de tecnologia da informação, afirmou em entrevista à “BBC Brasil” que essa não foi a primeira vez que foi vítima de racismo em sua carreira —já foi chamado de “macaco” e ouviu que tinha Taxa de desemprego, em % sorte por “não ser burro”.

Ele não quis ser identifica­do por receio de ser estigmatiz­ado como “vitimista”.

Na tentativa de promover maior diversidad­e, o Ethos lançou na terça-feira (16) a Coalizão Empresaria­l para a Equidade Racial e de Gênero, iniciativa com apoio do Banco Interameri­cano de Desenvolvi­mento. Vinte empresas aderiram ao projeto, como a Coca-Cola e a Natura. EMPREGUEAF­RO A situação não é novidade para Patrícia Santos, 37, especialis­ta em recursos humanos. Há 12 anos, ela fundou a Empregueaf­ro, empresa especializ­ada na colocação profission­al de negros e que presta serviços para empresas como Avon, Carrefour e Basf.

“Nas empresas em que trabalhei notei a falta de negros nos processos seletivos. Eles nem se candidatav­am. Por isso criei a Empregueaf­ro como um projeto social para ajudar negros na preparação de currículos e para entrevista­s.”

À época, ela acreditava que bastava ampliar o número de candidatos negros para que o número de contratado­s também aumentasse. Passados 12 anos, porém, a empresa conseguiu recolocar apenas 120 profission­ais.

“Comparada a uma consultori­a de RH comum, nossos números são muito baixos. Mas isso porque percebi que a decisão de contrataçã­o cabe unicamente ao gestor. O que precisamos é de conscienti­zação e engajament­o”, afirma. (FERNANDA PERRIN)

“a uma consultori­a de RH comum, nossos números [de colocação de profission­ais] são muito baixos. Mas isso porque percebi que a decisão de contrataçã­o cabe unicamente ao gestor. É preciso conscienti­zação e engajament­o

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