Curiosamente, o atual processo de redução da mata atlântica no sul da Bahia tem
O ciclo de destruição da floresta atlântica, que começou em 1500 por causa dos europeus, volta a ficar ativo na Bahia, revelam dados de um mapeamento florestal da ONG SOS Mata Atlântica e do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Muito impulsionada pela redução da mata na região sul do Estado, a Bahia foi campeã nacional de desmatamento da vegetação atlântica entre 2015 e 2016, segundo o atlas do desmatamento a que a Folha teve acesso.
No Estado, caíram 12.288 hectares de vegetação, um crescimento de 207% em relação à análise anterior, de 2014-2015. Três cidades do sul da Bahia —Santa Cruz de Cabrália, Belmonte e Porto Seguro— são responsáveis por metade desse total.
Bioma onde vivem 72% da população brasileira, a mata atlântica se estende do Rio Grande do Sul ao Piauí.
Em todo o país, a derrubada aumentou 57,7% no período em comparação ao ano anterior. Houve uma redução de 29.075 hectares de floresta.
O índice preocupa os especialistas da SOS Mata Atlântica. Há 10 anos não havia uma derrubada do bioma nessas proporções. CABRÁLIA componentes que remetem ao ciclo histórico dos tempos coloniais. Alguns fatores geográficos e socioambientais do desmate não mudaram.
A primeira missa em solo brasileiro ocorreu na região da atual Santa Cruz de Cabrália. Lá os índios viviam em meio a uma rica floresta, e o pau-brasil logo virou valiosa matéria-prima, motivando disputas pelo território.
Durante dois séculos, entre 1500 e 1700, estimativas científicas indicam que mais de 460 mil árvores da espécie que dá nome ao Brasil acabaram ceifadas da exuberante floresta, hoje conhecida pelo nome de mata atlântica.
O processo colonial de desmatamento, que praticamente acabou com o pau-brasil, envolveu dos donos dos negócios (os europeus que exportavam a madeira e faziam os corantes) aos índios, que faziam o escambo. Em um segundo período, também os escravos participaram.
Todos, por vários tipos de pressão ou dominação, participaram do aniquilamento.
A mesma Cabrália, além de Belmonte e Porto Seguro, aparecem na lista dos cinco maiores desmatadores (veja quadro à dir.).
A partir das coordenadas do satélite, a expedição de campo, via estradas de terra entre propriedades privadas desertas, dá formato à destruição. Após dois dias percorrendo o sul da Bahia, a diretora-executiva da SOS Mata Atlântica, Marcia Hirota, resume: “É muito triste”.
Os números captados pelas análises mostram que em Cabrália houve o desmate de 3.058 hectares de mata atlântica, mais de 10% do que caiu de todo o bioma no país.
Ainda não são claras as ra- OS DEZ MUNICÍPIOS QUE MAIS DESMATARAM Em hectares Santa Cruz de Cabrália* (BA) Belmonte* (BA) Manoel Emídio (PI) Wanderley (BA) Porto Seguro* (BA) Águas Vermelhas (MG) Canto do Buriti (PI) Alvorada do Gurguéia (PI) São João do Paraíso (MG) Jequitinhonha (MG)
MARCIA HIROTA
diretora-executiva da ONG SOS Mata Atlântica