Juiz afirma que pode ter ‘errado’ ao liberar áudio de Dilma e Lula
Judiciário não deve ser guardião de segredos sombrios, diz Moro
não só pelas testemunhas e documentos, mas também pelos detalhes da reforma personalizada.
É verdade que a demonstração de Moro impressiona, mas é claro que o recurso vai tentar chamar atenção do tribunal para outra leitura dos mesmos fatos. Aí serão outros juízes, outras cabeças.
O último ponto importante da sentença foi o exame da ligação entre o tríplex e o propinoduto —que, a partir de contratos com a Petrobras, teria sido montado pela OAS com o grupo político de Lula.
Há muitos elementos de prova quanto a isso, segundo a sentença.
O ponto mais delicado, em que o tribunal vai ter de se dedicar com equilíbrio, foi a conclusão quanto à liderança e o envolvimento de Lula.
Os executivos da OAS disseram que o tríplex foi descontado da conta da propina do PT. Moro levou isso em consideração na leitura de outras provas, que deram indicações no mesmo sentido. Mas é um ponto difícil, que o recurso vai atacar.
Na sentença em que condenou o ex-presidente Lula a prisão, na quarta (12), o juiz Sergio Moro mencionou a polêmica divulgação de áudios de conversas do petista, em 2016, e disse que pode “ter errado” na iniciativa.
A revelação do material, que incluía um telefonema de Dilma Rousseff para Lula, agravou a crise vivida no governo federal à época, que culminou no afastamento da então presidente no Congresso em maio do ano passado.
Moro lembrou que o ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki criticou na ocasião a medida com “palavras duras”.
“Ainda que, em respeito à decisão do Supremo Tribunal Federal, este julgador possa eventualmente ter errado no levantamento do sigilo, pelo menos considerando a questão da competência, a revisão de decisões judiciais pelas instâncias superiores faz parte do sistema judicial de erros e acertos”, escreveu Moro.
Em outros trechos, o juiz defendeu sua atitude. Disse que o Judiciário não deve ser o “guardião de segredos sombrios dos governantes”.
Moro escreveu ainda que havia outros áudios que não foram tornados públicos porque não eram relevantes para a investigação. “Fosse intenção deste juízo expor a privacidade do ex-presidente e de seus familiares, todos eles teriam sido divulgados, ou seja, centenas de diálogos adicionais, o que não foi feito.”
O juiz disse que as gravações mostravam “tentativas de obstruir investigações” e a intenção do petista de atuar contra a apuração com “todo o seu poder político”.
Lula foi indicado em 2016 ministro da Casa Civil de Dilma, mas acabou nunca assumindo o posto devido a uma liminar do Supremo Tribunal Federal.
(FELIPE BÄCHTOLD)