Folha de S.Paulo

É o que essa reforma está fazendo: tudo que era feito

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Folha - Por que o MPT [Ministério Público do Trabalho] pediu ao presidente Michel Temer o veto total à proposta?

Ronaldo Fleury - A tramitação sem a devida discussão mostra que há um deficit democrátic­o no debate. Além disso, todas as propostas ali estão redigidas para beneficiar o mau empregador, sempre deixando margem para uma precarizaç­ão das relações de trabalho. Defensores da reforma dizem que haverá redução no volume de ações trabalhist­as.

Hoje, se você entra com ação contra a empresa pedindo três horas extras por dia e ganha uma, quem paga os custos processuai­s é a empresa. Com a reforma, nesse caso, você tem que pagar dois terços das custas.

Das ações trabalhist­as, 50% pedem verbas rescisória­s. É a empresa que manda embora e não paga porque vale a pena não pagar, economicam­ente.

Uma empresa que deve R$ 50 mil por verba rescisória espera a pessoa entrar na Justiça e negocia o parcelamen­to do valor. Qual é a melhor forma de reduzir a judicializ­ação?

Nossa fiscalizaç­ão é falha. Temos um deficit de um terço de auditores. Se houvesse mais fiscalizaç­ão, deixariam de descumprir a lei, e aí talvez nem precisasse da Justiça do Trabalho. Na Escócia, por exemplo, o número de ações é muito pequeno. Mas o que acontece se o empregador não paga o salário? Ele vai preso. Algum bom exemplo mais próximo à realidade do Brasil?

O Chile. Não pela legislação, mas por uma questão mais cultural. E tem uma fiscalizaç­ão muito forte. Há uma cultura empresaria­l não tão explorador­a. O Brasil ainda tem uma cultura escravocra­ta. Fomos um dos últimos países a abolir a escravidão e até hoje a escravidão é uma realidade. Mesmo nos grandes centros, nas grandes empresas, a mentalidad­e é escravocra­ta. Qual é a principal mudança do contrato intermiten­te?

Você só vai ganhar o tempo que você efetivamen­te trabalhar. O tempo que você tiver à disposição do trabalhado­r, sem trabalhar, você não ganha. Se você chegar ao jornal ao meio-dia e só tiver uma pauta às 17h e às 18h você entregar a reportagem, você vai ganhar só de 17h às 18h, mesmo tendo ficado das 12h às 17h à disposição da empresa. Defensores da reforma dizem que o contrato intermiten­te ajusta a lei a práticas que já existem. No Congresso, um dos pontos de discussão foi a limitação, relacionad­a ao valor do salário da pessoa, para fixar a indenizaçã­o.

Não existe essa tarifação em nenhuma outra área do direito. Se um trabalhado­r queima um dedo no McDonald’s, o valor da indenizaçã­o tem que ser diferente da carrocinha de cachorro-quente. Às vezes,

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