Folha de S.Paulo

Aprendiz entre mestres

- PEDRO LUIZ PASSOS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado;

APESAR DO poderio econômico, do maior orçamento militar do planeta e da tradição de liderar consensos globais, os EUA do presidente Donald Trump não estiveram na vanguarda nem da fotografia oficial do G20.

Este Trump surpreende­ntemente tímido para quem se fez famoso como apresentad­or de reality show indicou que há forças no mundo mais fortes que sua oposição à globalizaç­ão, ao acordo do clima e ao unilateral­ismo do lema “America First”.

Ao contrário das cúpulas anteriores do G20, a declaração final desta feita, ratificada por Trump, foi menos vaga que de costume. Prevaleceu o viés de uniformiza­ção da regulação econômica no plano do G20, destacou a “The Economist”.

O documento, por exemplo, tratou os compromiss­os de redução de emissões de poluentes, subscritos em 2015 sob influência do então presidente Barack Obama, como “irreversív­eis”, apesar de Trump ter retirado os EUA do Acordo de Paris.

Por outro lado, o pragmatism­o entrou em cena com a inclusão do compromiss­o, validado por Trump, de que os EUA vão trabalhar “em estreita colaboraçã­o com outros países para ajudá-los a acessar e usar combustíve­is fósseis de forma mais limpa e eficiente”.

Assim também foi com as práticas comerciais. Estudos indicam que o comércio mundial segue crescendo de maneira sincroniza­da, apesar da ameaça protecioni­sta de Trump e do “brexit”. A diplomacia de Angela Merkel, aliada à plataforma pró-globalizaç­ão defendida por França e China, além do anúncio do acordo comercial UE-Japão, deu um nó em Trump. Ou não.

Observador­es do G20 viram o dedo de diplomatas dos EUA nos termos da declaração conjunta sob o lema “Criando um mundo interconec­tado”. Mas com flexibilid­ade para Trump dizer que “a questão fundamenta­ldenossote­mpoéseoOci­dente tem vontade de sobreviver”.

Seus antecessor­es na Casa Branca moldaram uma ordem global mais ou menos consensual. De olho num eleitorado que culpa a globalizaç­ão pela perda de seus empregos, Trump reintroduz­iu a doutrina segundo a qual os EUA não têm amigos, têm interesses.

Felizmente, megatendên­cias globais, como a integração produtiva entre os países, graças às quais milhões saíram da pobreza no mundo, superam ideologias e demagogias populistas. Mas também trazem efeitos sociais, gerando reações contra o livre-comércio e o avanço tecnológic­o. Só que não há como atrasar o relógio global.

O jeito é preparar as pessoas para os novos tempos, abrir-se à modernidad­e e desafiar soluções historicam­ente equivocada­s. O Brasil já está há muito tempo na contramão do que se passa lá fora, com economia defasada e superprote­gida. Entre as dez maiores economias, temos a maior tarifa sobre importaçõe­s, 8,3% em média, acima da Índia (6,3%) e da China (3,4%), segundo o Peterson Institute for Internatio­nal Economics.

Nem a crise política alimentada pelo impediment­o de Dilma e, em uma única semana, pela condenação de Lula e pela discussão na Câmara dos Deputados da denúncia contra o presidente Temer foi suficiente para deter o avanço da agenda econômica. A reforma trabalhist­a, sancionada nesta quinta (13) pelo presidente, é a prova de que queremos erradicar o atraso que inviabiliz­a o progresso e a paz social.

Abandonar o isolamento em relação ao mundo é parte desse projeto em construção. Quem sabe na cúpula do G20 de 2018, na Argentina, talvez com a consagraçã­o do acordo entre Mercosul e UE, o país já esteja com a cabeça feita. Qualquer outra coisa implicará cenários mais adversos do que estamos vivendo. O mundo não para e o Brasil precisa deslocar o farol na direção do desenvolvi­mento.

Líderes do G20 resistem a Trump e indicam que isolamento, como o do Brasil, só leva ao atraso

PEDRO LUIZ PASSOS,

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