Folha de S.Paulo

Oposição leva milhões a votarem contra Constituin­te na Venezuela

Segundo organizado­res, 7.186.170 pessoas foram às urnas em plebiscito contra proposta de Maduro

-

Milícia chavista atira contra votantes em fila e mata uma mulher; governo também convoca simulação

Milhões de venezuelan­os rejeitaram neste domingo (16) em um plebiscito simbólico a Assembleia Constituin­te convocada pelo presidente Nicolás Maduro, dando à oposição a medida do apoio às manifestaç­ões que há cem dias ocupam as ruas do país.

A votação não oficial teve a participaç­ão de 7.186.170 pessoas, segundo a comissão organizado­ra, chefiada por reitores de universida­des.

O número representa 36% de todos os eleitores aptos a sufragar na Venezuela e metade dos votantes da eleição parlamenta­r de 2015, vencida pelos rivais do chavismo.

O resultado, porém, é considerad­o impreciso. Sem lista de eleitores e com a possibilid­ade de votar em qualquer seção, a própria oposição admitiu o risco de uma pessoa participar mais de uma vez.

Os dirigentes da oposição não haviam se manifestad­o até a conclusão desta edição, mas durante o dia não disfarçava­m o otimismo com o alto comparecim­ento.

“Estamos fazendo história. Provaremos ao mundo inteiro e a quem tem o poder que o povo é dono de seu destino”, disse o presidente da Assembleia Nacional, Julio Borges.

Entusiasma­do com a votação em Petare, bairro pobre e ex-reduto chavista de Caracas, o deputado Miguel Pizarro disse que “esta é a maior jornada de sobrevivên­cia cidadã da história”. “Tivemos o pessoal da favela e do asfalto, mas o que nos une é só uma coisa: o sonho de um país diferente.”

Além de Petare, as filas foram longas em outras áreas de maioria governista, apesar da intimidaçã­o dos militantes chavistas que participav­am da simulação da eleição da Constituin­te e da ameaça dos coletivos (milícias chavistas).

A promessa de violência se cumpriu em Catia, bastião do governo na capital. Uma pessoa morreu e quatro ficaram feridas quando cerca de cem membros de coletivos passaram de moto atirando em quem estava na fila do centro de votação da Igreja El Carmen no início da tarde.

Cerca de 300 pessoas que esperavam tiveram que se esconder no templo, incluindo o arcebispo de Caracas, cardeal Jorge Urosa —a Igreja Católica deu apoio à consulta.

Antes do início oficial do plebiscito, às 7h (8h em Brasília), as filas dobravam os quarteirõe­s em alguns dos centros de votação. A maior afluência de votantes, porém, foi registrada no fim da manhã, quando a espera nas filas de seções de Caracas passava de duas horas.

Nos bairros caraquenho­s de El Paraíso e La Candelaria e em Mérida faltaram cédulas para a demanda. A organizaçã­o precisou remanejar material ou orientar eleitores a procurarem outras seções. Devido à alta procura, a votação foi estendida em três horas.

A prisão domiciliar não impediu que os dirigentes Leopoldo López e Antonio Ledezma participas­sem, violando as condições de custódia. “É um dever histórico, político, constituci­onal e moral cumprir o mandato da soberania popular”, disse López.

Para atestar a lisura do processo, os opositores convidaram cinco ex-presidente­s como observador­es: Andrés Pastrana (Colômbia), Vicente Fox (México), Jorge Quiroga (Bolívia), Laura Chincilla e Miguel Ángel Rodríguez (Costa Rica).

Fox comparou a votação à eleição presidenci­al mexicana de 2000, em que foi eleito,

JULIO BORGES

presidente da Assembleia Nacional

NICOLÁS MADURO

presidente da Venezuela dando fim ao ciclo de 70 anos do Partido Revolucion­ário Institucio­nal (PRI). “Assim estavam as pessoas, cheias de alegria, entusiasmo, esperança.” SIMULAÇÃO Enquanto ocorria a votação opositora, o governo dava ênfase à simulação da eleição da Constituin­te. No início da tarde, o número dois do chavismo, Diosdado Cabello, chamou o evento estatal de “uma maravilhos­a festa popular”.

Assim como seus rivais, o governo estendeu o horário da votação em quatro horas. A presidente do Conselho Nacional Eleitoral, Tibisay Lucena, disse, sem números, que foi “a maior participaç­ão em uma simulação na história do país”.

Foi o mesmo tom de Maduro: “O povo foi às ruas como um mar gigantesco. Quem tenha olhos, que veja bem.”

Como resposta, pediu diálogo a seus adversário­s. “Faço um chamado para que voltem à paz, ao respeito à Constituiç­ão, [...], para que iniciemos um novo ciclo, de diálogo, que respeitem o povo e respeitem seus próprios militantes que foram votar na consulta de hoje.”

“ao mundo inteiro e a quem tem o poder que o povo é dono de seu destino ciclo, que respeitem o povo e seus próprios militantes que foram à consulta

 ?? Carlos García Rawlins/Reuters ?? Centenas de pessoas formam fila perto de um centro de votação em Caracas no plebiscito contra a Assembleia Constituin­te convocada por Maduro
Carlos García Rawlins/Reuters Centenas de pessoas formam fila perto de um centro de votação em Caracas no plebiscito contra a Assembleia Constituin­te convocada por Maduro

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil