Folha de S.Paulo

Usar uma paixão para fazer minha outra paixão sorrir.”

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Em cima do fogão. No varal. Em cima do telhado e do micro-ondas. A criativida­de não tem limites quando se trata de Graciane Dias, 37, moradora de Araruna (PB).

De onde você possa imaginar, dentro ou fora da casa, há uma foto dela em cima de algum lugar. As poses quase nunca são as mesmas: pernas dobradas, mão na cintura, mão no rosto, braços e pernas esticados, uma infinidade de combinaçõe­s possíveis.

A primeira foto aconteceu em setembro de 2015, em um sábado ensolarado quando Graciane ainda morava no Rio Grande do Norte.

Ela tem quatro filhos. As meninas Waniga, 17, e Wenliga, 15, e os meninos Eclípson, 13, e Eglílson, 5. Os dois últimos possuem distrofia muscular, uma doença hereditári­a e degenerati­va das células musculares, que tornou o mais velho cadeirante.

Os meninos andavam tristes, cabisbaixo­s, em começo de depressão. Graciane, então, recordou que na infância gostava muito de subir em cima de “pedras, muros e cercas” quando batia a tristeza e convocou a criançada: “bora ali numa pedra”.

A mãe relembrou os velhos tempos, escalou o objeto e a filha mais velha tirou a foto. “Não fiquei nem no chão nem na pedra. Fiquei voando mesmo.” Foi o suficiente para os filhos caírem em uma gargalhada generaliza­da.

“Quando vi aquela risada, aquilo de repente tocou meu coração, e imaginei ‘já sei como fazer meu filho rir e esquecer do que está acontecend­o [o diagnóstic­o da doença saíra há pouco tempo]’.”

E para Graciane isso não foi nenhum problema, afinal ela sempre amou altura. “Vou SEM ROTEIRO Não há muita preparação ou um roteiro elaborado. Quando a ideia vem, não há quem tire da cabeça de Graciane a nova imagem. Ela chama a filha mais velha, a Waniga, fotógrafa oficial, e lá está a mãe, planando nas alturas.

Mesmo que o local escolhido seja um fogão ligado, sob advertênci­as da filha. “Mãe, não faça isso, vai se queimar”. “Eu falo para ela: só a mãe faz, não repete o que estou fazendo. Mas nunca aconteceu nada comigo. Para ver meus filhos felizes, eu sou capaz de entrar e sair do fogo.”

A risada, ela diz, acontece só quando a mãe está “lá em cima”, e não na preparação. Mas dura por muito tempo. “Os coleguinha­s deles comentam na escola que são fãs da mãe, que gostam das fotos deles. É uma diversão só.”

As redes sociais permitiram que as imagens de Graciane percorress­em o Brasil e o mundo. Os convites foram inevitávei­s: programa da Fátima Bernardes, na TV Globo, e do Rodrigo Faro, na TV Record.

Mais do que a fama —na região ela ficou conhecida como “a global”—, a aparição na televisão trouxe “uma quantia e um loteamento”, que ela usou para comprar uma casinha nova e mudar de Serra do São Bento (RN) para Araruna (PB), onde o acesso aos tratamento­s dos filhos — fisioterap­ia, psicólogos, exames laboratori­ais —é melhor.

As duas filhas mais velhas ajudam no dia a dia dos irmãos, já que Graciane e o marido trabalham na roça, longe de casa.

A mãe se diz disposta a continuar escalando os objetos mais inimagináv­eis. “Minha vida é como uma novela, mas uma novela real”, afirma.

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