Folha de S.Paulo

Usando remédios vencidos

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SÃO PAULO - Em tempos de vacas magras, o administra­dor público tem o dever de otimizar os recursos de que dispõe. Tenho uma sugestão que pode trazer alívio para os cofres da saúde: usar remédios vencidos.

Sim, sei que parece uma heresia. Mas quem conhece os trâmites de licenciame­nto de drogas sabe que a data de validade não passa de uma aproximaçã­o —e bastante enviesada em favor do descarte. A ProPublica acaba de divulgar uma reportagem de Marshall Allen mostrando como as coisas funcionam e como se pode economizar bilhões de dólares estendendo o prazo de validade de drogas.

Remédios podem estragar. Isso é um fato. Assim, o licenciame­nto exige que haja uma data de vencimento. O problema é que ela é estabeleci­da através de pouca pesquisa e muito chute. A maioria dos fármacos vale entre dois e três anos. Como os laboratóri­os ganham sempre que uma farmácia ou hospital é obrigado a descartar drogas vencidas e repô-las, têm pouco interesse e estabelece­r com precisão a validade real.

Mas, como todo mundo sabe que princípios ativos não perdem suas propriedad­es da noite para o dia, o próprio governo federal americano armazena grandes quantidade­s de remédios vencidos para a eventualid­ade de emergência­s sanitárias. De vez em quando, essas drogas são testadas e boa parte delas continua eficaz mesmo décadas depois do prazo.

Como os americanos são práticos, a Força Aérea pediu em 1986 à FDA (agência de medicament­os) e ao Departamen­to de Defesa que lançassem um programa de extensão do prazo de validade. A cada ano, testavam amostras antigas de drogas caras das quais os militares tinham um grande estoque prestes a vencer e, se funcionass­em, a expiração era adiada. Em 2016, as Forças Armadas gastaram US$ 3,1 milhões no programa e economizar­am US$ 2,1 bilhões em custos de reposição, um retorno de US$ 677 por dólar investido. É o caso de pensar em algo assim no Brasil. helio@uol.com.br

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