Folha de S.Paulo

Há vagas, sem carteira

Desemprego enfim cede, mas contrataçõ­es acontecem no mercado informal; economia resiste à incerteza política e ensaia melhora ainda tímida

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Decorridos quase três anos de deterioraç­ão, acumulam-se sinais de que o pior tenha ficado para trás no mercado de trabalho. Os dados mais recentes permitem antever uma lenta queda do desemprego, por ora ainda ancorada em contratos sem carteira assinada.

Segundo o IBGE, a taxa de desocupaçã­o caiu a 13% no trimestre concluído em junho, o equivalent­e a 13,5 milhões de pessoas —700 mil abaixo do recorde de março.

Tal progresso foi motivado, em especial, pelo cresciment­o do emprego informal e daquele por conta própria (que, em grande parte, se dá em circunstân­cias precárias).

As duas modalidade­s respondem hoje por pouco mais de 33 milhões de vagas, ou 36,7% da população ocupada. De outro lado, o contingent­e de celetistas, de cifra semelhante, permanece em queda.

Tal dinâmica não chega a ser surpreende­nte. O trabalho com carteira assinada tende a seguir mais de perto a atividade econômica. A contração do consumo e do investimen­to, ainda por ser revertida, leva as empresas a demitir, lançando pessoas à informalid­ade.

Não deixa de ser boa notícia, de todo modo, que o mercado tenha voltado a contratar, mesmo em condições menos favoráveis. Esse é o primeiro passo rumo à recuperaçã­o, que, para ser sustentada, ainda depende do restabelec­imento da confiança empresaria­l.

Os números também mostram leve, porém significat­ivo, cresciment­o da renda. Na comparação com o mesmo período de 2016, o salário médio real (descontada a inflação) cresceu 3%. Ainda é pouco, decerto, e em parte decorrente da redução acentuada da inflação, mas nada desprezíve­l.

Aos indicadore­s do emprego se somam outras evidências de que a economia encontrou o fundo do poço e começa a ensaiar uma tímida retomada. Depois da alta de 1% do PIB no primeiro trimestre, havia o temor de um novo recuo, reforçado pelo enfraqueci­mento do governo Michel Temer (PMDB).

Não se vê, ao menos até aqui, uma recaída recessiva. Mesmo com alguma retração na confiança de empresas e consumidor­es, houve alta das vendas e da produção ao longo do segundo trimestre. O crédito também dá sinais de vida.

Os mercados se mostram resistente­s ao noticiário de Brasília. Contribuem para tanto fatores como a queda acentuada da inflação —que reforça a renda dos consumidor­es e favorece o corte dos juros— e a safra agrícola recorde, que trouxe alento ao interior do país.

Não se trata, porém, da superação da crise. No ambiente de enorme incerteza política, ainda não se vislumbra a volta de investimen­tos em larga escala, necessário­s para a queda sensível do desemprego.

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