Folha de S.Paulo

Roteiro da empulhação

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SÃO PAULO - O roteiro é velho. Já bem antes da reforma trabalhist­a que extinguiu o imposto sindical, sempre que alguém lembrava que era necessário acabar com essa taxa anacrônica, as agremiaçõe­s trabalhist­as tratavam de reembalá-la sob o rótulo de “contribuiç­ão assistenci­al” ou “contribuiç­ão negocial”. A ideia era que as entidades sindicais continuass­em recebendo a prebenda, mas sob outro nome.

Até a CUT, que em algum momento parece ter sido genuinamen­te favorável ao fim do imposto, aderiu à engambelaç­ão. Ao menos em tese, a mudança poderá custar ainda mais ao trabalhado­r. É que o imposto sindical era fixado por lei em um dia do salário anual de cada membro da categoria, fosse ele sindicaliz­ado ou não. Pelas versões mais populares dessa jogada, o valor da contribuiç­ão que o substituir­ia seria decidido em assembleia da categoria, podendo ser maior que um dia de salário. Também recairia sobre toda a base.

Se Temer ceder à pressão das en- tidades e colocar algo nessa linha na MP que restringir­á os efeitos da reforma trabalhist­a, estará cometendo uma empulhação. Sou sensível ao argumento de que seria ruim passar o rodo sobre nosso sistema sindical sem nem dar às entidades a chance de adaptar-se. Nesse caso, porém, o mais indicado a fazer seria criar um mecanismo de extinção gradual do imposto, que teria seus valores reduzidos ano a ano até deixar de ser cobrado após, digamos, um triênio. O que não faz sentido é substituir a taxa por uma contribuiç­ão que poderá continuar existindo para sempre, mantendo inalterado o “statu quo”.

Sindicatos fortes são necessário­s para equilibrar o conflito distributi­vo entre capital e trabalho. A melhor forma de não termos agremiaçõe­s fortes, como já sabia Vargas, é atrelá-las ao Estado num sistema que combina a unicidade sindical (que elimina a concorrênc­ia) com o recolhimen­to compulsóri­o das anuidades (que estimula as entidades de fachada). helio@uol.com.br

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