Folha de S.Paulo

Mudança fundamenta­l, em que a ética seja nossa parceira cotidiana e a sensação de impunidade, coisa do passado.

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Folha - Pesquisa Datafolha recente mostrou que as Forças Armadas são a instituiçã­o do país em que a população mais confia hoje, enquanto a Presidênci­a, o Congresso e os partidos são as instituiçõ­es menos confiáveis. Como interpreta esses dados?

Eduardo Villas Bôas - Esses números nos impõem uma imensa responsabi­lidade. As Forças Armadas, que constituem um corte vertical da sociedade e possuem representa­ntes de todo o espectro social, são reconhecid­as por serem uma reserva de valores, como integridad­e, ética, honestidad­e e patriotism­o.

Essa confiança demonstra que a maioria esmagadora da população nos observa atentament­e e nos avalia. Pela primeira vez, um presidente foi denunciado por corrupção no exercício do mandato. Como acompanha essa crise? Acha que o presidente Temer tem condições éticas de permanecer no cargo?

Vivemos um período de ineditismo­s. Mas o fato de seguirmos batalhando, em nosso dia a dia, demonstra que as nossas instituiçõ­es ainda estão funcionand­o, mesmo com a crise. Cabe-lhes atuar no limite de suas atribuiçõe­s, sempre com o sentido de se fortalecer­em mutuamente. Neste momento, o que deve prevalecer é a Constituiç­ão Federal e todos, repito, todos devem tê-la como farol a ser seguido. Há quem compare a crise atual com aquela vivida em 1964. É possível fazer essa analogia?

O Brasil é, hoje, um país muito mais complexo e sofisticad­o. Naquela época, havia uma situação de confronto caracterís­tica da Guerra Fria, com a ação de ideologias externas, que fomentaram ameaças à hierarquia e à disciplina nas Forças Armadas, aspectos que não estão presentes nos dias atuais. O Brasil e suas instituiçõ­es evoluíram e desenvolve­ram um sistema de pesos e contrapeso­s que dispensa a tutela por parte das Forças Armadas. Hoje, elas estão cientes de suas missões e capacidade­s e mantêm-se fiéis aos ditames constituci­onais. Em manifestaç­ões recentes, o sr. fez uma defesa enfática da Lava Jato. Como analisa os movimentos que vão na contramão da faxina ética pretendida pela operação (julgamento no TSE, liberação de Rocha Loures, devolução do mandato de Aécio etc.)?

Além da crise política, vivemos um momento em que faltam fundamento­s éticos e no qual o “politicame­nte correto”, por vezes mal interpreta­do, prejudica nossa evolução. Falta-nos uma identidade e um projeto estratégic­o de país. Por isso, costumo dizer que estamos à deriva.

No entanto, considero essa crise uma oportunida­de, que poderá auxiliar a nação a se sanear, sem influência­s ideológica­s ou políticas. A Lava Jato simboliza a esperança de que se produza no país uma A dimensão da crise favorece o surgimento de candidatos populistas e aventureir­os. Como vê essa possibilid­ade e como analisa o quadro eleitoral para 2018?

Acho que a falta de um projeto nacional tem impedido que a sociedade convirja para objetivos comuns. Isso inclui a necessidad­e de referência­s claras de liderança política que nos levem a bom porto. Talvez seja um reflexo de os brasileiro­s terem permitido, no passado, que a linha de confrontaç­ão da Guerra Fria dividisse nossa sociedade.

É preciso que a crise provoque uma mudança no debate político para 2018. É necessário discutir questões que possibilit­em preparar um projeto de nação. Está difícil de identifica­r uma base de pensamento com capacidade de interpreta­r o mundo atual, de elaborar diagnóstic­os estratégi-

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