Folha de S.Paulo

Investindo no passado

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SÃO PAULO - Sou confiante em relação ao futuro da humanidade, mas acho cada vez mais difícil estender esse otimismo para o Brasil.

A crise econômica em que nos metemos, e da qual levaremos alguns anos para sair, coincide com a porção final de nosso bônus demográfic­o, o período em que a proporção de pessoas em idade de trabalhar é maior que a de dependente­s (crianças e idosos). Se não aproveitar­mos essa janela mais favorável para nos tornarmos um país rico, fazê-lo depois fica bem mais difícil. Nosso bônus vai mais ou menos até 2030. Como, devido à crise, o PIB “per capita” brasileiro registrado em 2013 só deverá ser retomado lá por 2023, desperdiça­mos uma década. A essa altura, parece improvável que o Brasil consiga deixar de ser um país de renda média para entrar no clube dos ricos.

Se essas consideraç­ões já me punham num estado de ânimo derrotista, o quadro piorou substancia­lmente após ler na Folha reportagem de Ana Estela de Sousa Pinto e Gustavo Patu sobre a situação orçamentár­ia de Estados brasileiro­s, a maioria dos quais já gasta mais com aposentado­s do que com educação. Das 27 unidades federativa­s, 16 compromete­m maior fatia do orçamento com servidores inativos do que com a educação. Os campeões são RS, RJ, AL, MG e RN, onde os aposentado­s ficam com mais que o dobro do que é destinado aos estudantes.

Isso significa que nós estamos investindo no passado, não no futuro. Se existe alguma chance de o Brasil escapar à chamada armadilha da renda média, ela está em nos tornarmos uma usina de inovações relevantes. Riqueza é, em última análise, boas ideias. E é muito mais provável que soluções criativas surjam nas mentes de jovens bem educados do que da massa ignara ou de aposentado­s. É claro que o poder público não pode romper contratos e abandonar os inativos, mas precisamos pelo menos ter um sistema que mire nas prioridade­s certas. helio@uol.com.br

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