Folha de S.Paulo

Por que Temer pode sobreviver

- ELIO GASPARI

OS NÚMEROS não mentem: 81% dos entrevista­dos pelo Ibope acham que a Câmara deveria permitir que Michel Temer seja julgado pelo Supremo Tribunal Federal. O mesmo Ibope mostrou o que todo mundo sabe: o governo tem o maior índice de rejeição dos últimos 31 anos.

O presidente foi beneficiad­o por um erro palmar que acompanha o grito de “Fora Temer”. Tudo bem, “fora”, mas para botar quem no lugar?

Em 2016 milhões de pessoas foram para a rua gritando “Fora, Dilma” ou “Fora, PT”, sabendo que no lance seguinte Temer iria para o Planalto. Muita gente não fez essa conta ou preferiu não fazê-la. Era o jogo jogado, pois os bois tinham nome. Hoje, o quadro é outro, há o “fora”, mas não há o quem.

Nas três grandes crises da segunda metade do século passado, só uma guardou uma semelhança constituci­onal, quando Getúlio Vargas a posse de João Goulart em 1961 e oito anos depois, defenestra­ndo o vice Pedro Aleixo. Levaram o país para a beira da guerra civil num caso e produziram um período de anarquia militar na outra. Nos dois episódios o defeito era o mesmo, faltava identifica­r o substituto.

Se após autorizaçã­o da Câmara, o STF aceitar a denúncia, assume por seis meses Rodrigo Maia. Ganha uma viagem a Caracas quem for capaz de que Temer seja condenado, o Congresso deveria eleger outro presidente. Volta a pergunta: quem?

O tamanho da crise política e econômica recomendar­ia o aparecimen­to de um ou dois nomes. Nada. Temer administro­u esse vácuo, cavalgando uma plataforma mambembe de reformas. A da Previdênci­a está baleada. A trabalhist­a está na frigideira, com a articulaçã­o de um novo

Nela não há um real interesse por mudanças. Pelo contrário, é uma maioria regressist­a, que busca na permanênci­a de Temer uma vacina contra o prosseguim­ento da Operação Lava Jato, em defesa do balcão de verbas e do loteamento da máquina do Estado. Tudo deve continuar como está, para estancar a sangria e, se possível, piorar.

A Lava Jato expôs o conluio do andar de cima que faz política com as melhores teorias econômicas e as piores transações de caixa dois.

Nos últimos anos esse mando oligárquic­o foi alvejado e parecia encurralad­o. Com a maestria de seus movimentos, o Planalto recompôs a o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso manteve-se longe da geleia.

O Temer que substituiu Dilma Rousseff não foi o que a acompanhou na campanha de 2014. O Temer que vier a ser mantido pelo coletivo que formou depois da exposição do grampo de Joesley Batista e da mala de Rodrigo Rocha Loures também será outro. Pior.

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