Folha de S.Paulo

Brasil vai pesquisar autismo de filhos de decasségui­s

ONGs indicam que taxa entre brasileiro­s é o triplo da de japoneses, mas não há dados oficiais; inscrição de projetos vai até setembro

- ANA ESTELA DE SOUSA PINTO

Quantos são os brasileiro­s que não conseguem acompanhar as escolas públicas do Japão? É verdade que a proporção de alunos brasileiro­s considerad­os autistas é mais que o triplo da de japoneses?

Atrás de respostas científica­s para indícios ainda extraofici­ais, a Embaixada do Brasil no Japão divulgou um edital de pesquisa, com inscrições até 19 de setembro.

Reportagem da Folha mostrou que dificuldad­es de adaptação dos filhos de decasségui­s (imigrantes brasileiro­s no Japão) levam ao fracasso escolar das crianças.

Com os pais em jornadas de até 16 h/dia em indústrias, algumas delas acabam ficando duplo-analfabeta­s: sem saber ler ou escrever nem em japonês nem em português.

Segundo levantamen­tos feitos por organizaçõ­es não governamen­tais, mais de 6% dos filhos de decasségui­s são diagnostic­ados como autistas pelo sistema público escolar japonês. A taxa entre estudantes japoneses é 2% (na média global, segundo a Organizaçã­o Mundial de Saúde, 0,62% das crianças recebem esse diagnóstic­o).

Sob “espectro autista” estão classifica­dos vários distúrbios de comunicaçã­o e comportame­nto.

A preocupaçã­o de entidadant­es des, pais e embaixada é que, no Japão, o aluno que recebe esse diagnóstic­o é encaminhad­o para salas especiais.

“Acaba com a vida da criança. Nunca mais ela vai participar da escola normal”, diz Norberto Mogi, presidente do Serviço de Assistênci­a aos Brasileiro­s no Japão (Sabja), que selecionar­á os pesquisado­res e universida­des.

Ele considera possível que a dificuldad­e de comunicaçã­o entre as crianças brasileira­s e os avaliadore­s japoneses leve a diagnóstic­os falhos. À ESPERA DE POLÍTICAS Ter um dimensiona­mento preciso do problema é fundamenta­l para apoiar políticas públicas, diz Ivan Carlo Padre Seixas, diplomata responsáve­l por Comunidade na Embaixada do Brasil em Tóquio.

O governo japonês, que informa haver exatos 80.119 alunos não japoneses em suas escolas, diz desconhece­r quantos deles são brasileiro­s.

Pesquisa oficial mais recente aponta quase 9.000 alunos que falam português, mas não dominam o japonês.

Mas, sem o total de estu- brasileiro­s, é impossível estimar a proporção.

O ministério diz também não ter dados sobre quantos filhos de imigrantes deixam o sistema público ao enfrentar dificuldad­es com japonês.

“Nossa orientação é que as escolas aceitem gratuitame­nte todos os estrangeir­os e que deem igualdade de oportunida­des e acesso a educação.”

A pesquisa brasileira deve começar em janeiro de 2018 e será financiada com recursos da Associação de Damas Latino-Americanas do Japão. Segundo Seixas, ainda não há previsão de custo. O pagamento será feito pelo Sabja.

Enquanto isso, o apoio aos filhos de decasségui­s é feito principalm­ente por ONGs.

“A maioria dos pais fica perdida, sem saber o que fazer com os filhos diagnostic­ados”, diz a psicóloga Kyoko Nakagawa, coordenado­ra do projeto Kaeru.

Mais informaçõe­s sobre o edital para projetos de pesquisa estão no site da Embaixada do Brasil em Tóquio: http://toquio.itamaraty.gov. br/pt-br/News.xml

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David Guttenfeld­er - 18.nov.1999/Associated Press Filhos de decasségui­s que não falam japonês leem em escola brasileira em Ota, no Japão

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