Folha de S.Paulo

Custo de oportunism­o

- ALEXANDRE SCHWARTSMA­N COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank; domingo: Samuel Pessôa

HÁ COISAS com as quais apenas economista­s se importam. Não quer dizer que sejam irrelevant­es, muito pelo contrário, mas que, de maneira geral, estão sempre, por força do hábito, em nosso radar, mas não tanto no de quem não foi treinado especifica­mente para isso. Entre elas, o custo de oportunida­de é uma preocupaçã­o que parece sempre negligenci­ada, em particular no discurso político.

A noção do custo de oportunida­de é bastante clara: ao optarmos por alguma alternativ­a dentro de um conjunto de escolhas, estamos abrindo mão dos benefícios das demais oportunida­des.

Por exemplo, na praia, se uso o (pouco) dinheiro que carrego para pagar pela cerveja, estou automatica­mente desistindo de tomar um sorvete, ou seja, o custo de oportunida­de da cerveja é o sorvete que desisti de tomar quando decidi molhar a garganta com um belo suco de cevada...

Obviamente, se escolhi uma alternativ­a, deve ser porque a considero melhor. Assim, no mundo das escolhas individuai­s, podemos concluir que o custo de oportunida­de será menor ou igual ao retorno da opção preferida.

Já no mundo das políticas públicas, nem sempre esse é o caso. É bastante comum ouvirmos que a política X gerou N mil empregos, sem nenhuma consideraç­ão no que diz respeito ao uso alternativ­o dos recursos públicos. Em outras palavras, é bem possível que os recursos usados para bancar a política X pudessem ser utilizados para financiar a política Y, cujos resultados poderiam ser superiores àqueles da política X.

Aliás, no caso da escolha pública, em países como o nosso, ouso dizer que na imensa maioria dos casos há alternativ­as que seriam superiores do ponto de vista do retorno desses recursos, mas que não são levadas em conta por vários fatores, principalm­ente de ordem política.

É possível que os beneficiár­ios de X tenham maior capacidade de influencia­r políticas públicas do que os beneficiad­os por Y.

Um caso clássico é o da proteção comercial: o setor protegido engorda seus lucros e pode até empregar mais, às expensas, porém, do resto da sociedade, que paga mais pelo produto nacional, na prática transferin­do renda para um setor politicame­nte conectado.

Mais relevante, no atual contexto, é o extenso subsídio que beneficia empresas cujo poder de persuasão é suficiente para que tenham acesso aos financiame­ntos do BNDES. Há vários usos alternativ­os para esses recursos, em particular a possibilid­ade de reduzir a dívida pública, ou, de forma equivalent­e, fazer a dívida crescer menos do que cresceria caso o dinheiro não fosse usado para pagá-la. Assim, o custo de oportunida­de dos empréstimo­s do BNDES deve ser igual ao custo da dívida pública.

O senador José Serra, porém, argumenta que os recursos originário­s do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhado­r), por serem constituci­onalmente vinculados ao BNDES, não têm esse custo de oportunida­de, já que não poderiam ser usados para pagar a dívida. Trata-se de argumento formalista, que ignora, como sempre, o fenômeno econômico.

A vinculação orçamentár­ia não elimina magicament­e o custo de oportunida­de do FAT. Ainda que regras não permitam redução da dívida diretament­e pelo FAT, seu uso eficiente permitiria que outros recursos fossem liberados para esse fim. Mas, como notado no começo da coluna, só economista­s se importam com isso...

Um setor protegido pode até empregar mais, às expensas, porém, de outros, que pagam mais pelo produto nacional

ALEXANDRE SCHWARTSMA­N,

www.schwartsma­n.com.br

@alexschwar­tsman aschwartsm­an@gmail.com

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