Folha de S.Paulo

Tolerância à Trump

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Diz uma velha máxima que só a experiênci­a não piora com o tempo, mas pelo visto isso não se aplica a Donald Trump. O presidente americano deu novas mostras de inépcia verbal nos últimos dias, e logo em caso que mereceu o epíteto de terrorismo doméstico.

Longas 48 horas transcorre­ram entre o atropelame­nto de manifestan­tes por James Alex Fields Jr., um militante racista, e as primeiras declaraçõe­s sensatas de Trump. E ele só as fez porque suas primeiras manifestaç­ões desencadea­ram uma tempestade de protestos.

“O racismo é mau”, disse, na sua pobre retórica. “E aqueles que causam a violência em seu nome são criminosos e bandidos, incluindo KKK [Ku Klux Klan], os neonazista­s, os supremacis­tas brancos e outros grupos de ódio que são repugnante­s a tudo o que apreciamos como americanos.”

Em sua primeira reação, ainda no sábado (12) da tragédia em Charlottes­ville (Virgínia), Trump colhera reações adversas até de republican­os ao culpar, durante um discurso para veteranos, “os vários lados” pela violência que levou à morte de uma mulher.

Suas palavras iniciais foram interpreta­das como recusa a condenar os extremista­s de direita, que apoiam sua política de restringir a entrada de imigrantes nos Estados Unidos. Ou seja, como uma forma de tolerância com o terror praticado por norte-americanos.

Na tentativa de amenizar a má repercussã­o, a Casa Branca decidiu emitir no domingo um comunicado condenando “supremacis­tas brancos” pela violência, mas num texto sem assinatura.

Na segunda-feira foi a vez de o secretário de Justiça, Jeff Sessions, reiterar que Trump condenava, sim, o ataque racista. A essa altura, entretanto, apenas um anúncio de viva voz do presidente poderia estancar a onda de indignação, que somente crescia.

O republican­o falou o que tanto se esperava dele, afinal, mas sua prolongada hesitação em condenar conterrâne­os homicidas contrasta com a ligeireza com que se pronunciou sobre assuntos tão ou mais graves do que esse.

Não se observou ambiguidad­e alguma, por exemplo, quando Trump externou, nos últimos dias, suas ameaças belicosas a Kim Jong-un, da Coreia do Norte, e a Nicolás Maduro, da Venezuela.

Não que esses ditadores mereçam condescend­ência, mas do líder da maior potência militar do planeta se espera algum traquejo diplomátic­o em declaraçõe­s capazes de exacerbar conflitos.

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