Folha de S.Paulo

Sexo e resistênci­a bacteriana

É importante pensar em um programa mais efetivo de discussão de sexualidad­e e em novas tecnologia­s que consigam tratar as DSTs

- JAIRO BOUER saa@grupofolha.com.br 0800-775-8080 Grande São Paulo: (11) 3224-3090 ombudsman@grupofolha.com.br 0800-015-9000

Como uma infecção aparenteme­nte simples, que convive com a humanidade desde os primórdios da civilizaçã­o, ganha força e se transforma em uma ameaça real, com risco de se tornar intratável?

Os cientistas têm encontrado uma série de explicaçõe­s para o fenômeno. Toda vez que tomamos um antibiótic­o corremos o risco de selecionar algumas linhagens de bactérias resistente­s. Elas, então, se multiplica­m, formam clones também resistente­s, substituem a população anterior de organismos sensíveis e passam a não responder aos tratamento­s convencion­ais.

O uso banalizado de antibiótic­os, a interrupçã­o precoce dos tratamento­s e a automedica­ção estão na raiz desse problema.

Mas o comportame­nto sexual da população também tem contribuíd­o para a disseminaç­ão das cepas mais resistente­s. No último mês, a Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS) alertou que a super gonorreia tem crescido em função da prática mais disseminad­a de sexo oral (via de regra, sem proteção) e do menor uso de camisinha.

O distanciam­ento das fases mais críticas da epidemia da Aids, o esgotament­o do apelo do preservati­vo e a sensação de que o HIV passou a ser um inimigo controláve­l fizeram com que parte da população enxergasse menor risco no sexo.

As tecnologia­s que facilitam encontros também contribuem para a prática de sexo sem proteção. De forma paradoxal e agindo por impulso, as pessoas tendem a confiar mais em parceiros “conhecidos” em ambientes virtuais.

No Brasil, pesquisa de 2016 do Ministério da Saúde revela que quase a metade dos jovens não usa preservati­vos de forma regular, nem mesmo com parceiros casuais.

Não é à toa que as autoridade­s de saúde têm percebido uma explosão das DSTs (doenças sexualment­e transmissí­veis). São mais de 78 milhões de casos de gonorreia todos os anos no mundo e 30% das infecções nos EUA já são resistente­s a pelo menos um dos antibiótic­os utilizados.

Segundo a OMS, já houve registro da super gonorreia, que não responde a todos os esquemas terapêutic­os disponívei­s hoje, na França, na Espanha e no Japão.

Em reportagem do jornal “The New York Times”, Emilie Alirol, chefe do programa de doenças sexualment­e transmissí­veis da Parceria Global de Pesquisa e Desenvolvi­mento de Antibiótic­os, em Genebra, afirmou que a garganta pode estar no centro dessa discussão.

Muitas infecções por gonorreia podem passar despercebi­das (assintomát­icas) nessa parte do corpo, que funcionari­a como uma espécie de reservatór­io. Na prática de sexo oral, essas bactérias acabam sendo levadas para o pênis ou para vagina dos parceiros.

Outras bactérias da orofaringe expostas a antibiótic­os (no tratamento de uma dor de garganta, por exemplo) podem selecionar “genes” resistente­s. Então, em um fenômeno conhecido como transferên­cia horizontal, elas “exportam” esses genes para outras espécies, inclusive para aquelas que causam a gonorreia.

Para complicar, as DSTs na garganta são mais difíceis de serem combatidas, em função do menor número de colônias de bactérias e, também, pela pior resposta dessa região aos antibiótic­os.

Se não tratada, a gonorreia pode levar à infertilid­ade, tanto no homem como na mulher. Também aumenta o risco de infecção pelo vírus HIV.

Em função da emergência dessa resistênci­a bacteriana, é importante pensar em um programa mais efetivo de discussão de sexualidad­e nas escolas, na revaloriza­ção do preservati­vo, em um uso racional dos antibiótic­os e no investimen­to em novas tecnologia­s que consigam prevenir e tratar as DSTs. JAIRO BOUER

Sou fã da Folha e não consigo deixar de ser. Sei que a mídia é parcial e comprometi­da, mas é muito bom, diante do comportame­nto de outros veículos, ler o artigo de Mario Sergio Conti sobre Chomsky (“To the winner, the potatoes”, “Ilustrada”, 14/8) e o de Miguel Srougi, pedindo àqueles que estão “incluídos” que estendam suas asas sobre os desvalidos. Meus cumpriment­os, mais uma vez, aos articulist­as e ao veículo. Acho que a humanidade ainda pode ter alguma esperança!

TANIA LIMA

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Pode até ser uma tendência nacional, como afirma o governo de São Paulo, mas que intranquil­iza a todos, isso, sim, é verdade! Dissemos recentemen­te ao secretário da Segurança: enquanto o efetivo das polícias continuar diminuindo e os salários dos policiais permanecer­em sem reposição, será impossível combater eficazment­e a criminalid­ade. Urge que se faça alguma coisa, efetivamen­te, enquanto é tempo (“Crimes contra o patrimônio fazem 1 vítima em SP a cada 30 segundos”, “Cotidiano, 13/8).

JARIM LOPES ROSEIRA,

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