Morre pioneiro no estudo de quadrinhos
Álvaro de Moya, morto aos 87 anos, abraçou o gênero nos anos 1950, quando pais e educadores condenavam as HQs
Pesquisador paulistano ligado à USP também trabalhou em jornais, em emissoras de televisão e no cinema FOLHA
O autor, professor e pesquisador Álvaro de Moya, tido como um dos principais pesquisadores de histórias em quadrinhos do país, morreu nesta segunda-feira (14) aos 87 anos em decorrência de um AVC (acidente vascular cerebral).
Em visita à feira Comic Con Experience de 2016, o paulistano passou em uma cadeira de rodas por uma multidão de jovens entusiasmados que não tinham ideia de quem era: o maior responsável por eventos de HQs no Brasil.
Ele foi o primeiro a abraçar o segmento, quando pais, professores e psicólogos consideravam o gênero prejudicial à formação das crianças.
Em 1951, ao lado de colegas, Moya foi responsável por organizar a Primeira Exposição Internacional de Histórias em Quadrinhos, em São Paulo, que apresentou as HQs como arte —algo inédito.
O amor pela chamada “nona arte” —maneira como entusiastas se referem aos quadrinhos— começou ainda criança, quando ocupava seus dias copiando as gravuras do “Suplemento Juvenil”, publicação brasileira que importava quadrinhos de heróis americanos, de seu irmão Raul.
Assim que o seu irmão ia para a escola, Moya entrava escondido em seu quarto e copiava os desenhos de seu ídolo, o quadrinista Alex Raymond, responsável por personagens Flash Gordon.
O amor cresceu e se transformou em missão de vida quando o menino ouviu da boca do irmão que desenhava bem. Decidiu, então, que se tornaria autor de quadrinhos.
Moya não criou ficções como seus ídolos, mas mudou os estudos sobre o tema.
“Ele foi o pioneiro das histórias em quadrinhos no Brasil. Acreditava no potencial do gênero em expressar sentimento, e me inspirou a também acreditar nisso”, diz o professor da USP Waldomiro Vergueiro.
Ao lado de mais um colega, Moya e Vergueiro foram responsáveis por fundar o Observatório de Histórias em Quadrinhos da USP.
No campo teórico, Moya foi autor do clássico “Shazam” (1970), primeiro livro brasileiro inteiramente dedicado à análise de HQs. Em vez de discutir só aspectos práticos dos quadrinhos, a obra também debate as influências pedagógicas do gênero e defende que as HQs devem ser levadas mais a sério pela academia.
Amigo do americano Will Eisner (1917-2005), uma das maiores lendas dos quadrinhos, Moya iria lançar no próximo domingo (20) um livro de memórias que comemoraria suas sete décadas de carreira e o centenário do nascimento do colega.
A obra chama-se “Eisner/ Moya-MemóriasdeDoisGrandes Nomes da Arte Sequencial” (editora Criativo, R$ 39,90, 96 págs.). TV E JORNALISMO Mas a atuação de Moya não se restringiu ao campo dos quadrinhos. Seu primeiro emprego foi no jornal mineiro “O Tempo”, onde trabalhou como chargista e ilustrador. O pesquisador também fez diversas colaborações para a Folha .A última, em abril, tratava do cartunista Belmonte.
Na televisão, foi responsável por desenhar os letreiros de inauguração da TV Tupi. Sua passagem pela extinta emissora lhe rendeu outros empregos no meio: trabalhou na americana CBS e foi diretor da TV Excelsior.
Sua experiência na Excelsior rendeu o livro “Gloria in Excelsior” (Imprensa Oficial, 2004, 416 págs), que traz relatos sobre os bastidores, a programação e os problemas políticos que levaram a concessão da emissora a ser cassada durante a ditadura militar.
Sob o codinome de Geraldo Dominó, produziu também a pornochanchada “A B...Profunda” (1984), no qual parodiava o clássico “Garganta Profunda”.
Em 2013, ele perdeu a mulher, a roteirista Cláudia Lévay, com quem foi casado por três décadas. Álvaro de Moya deixa um filho.