Em novo disco, Jorge Drexler fala de migração
DOS ENVIADOS AO RIO
Def Leppard e Alice Cooper imprimiram ao Rock in Rio desta quinta (21) uma sensação forte de nostalgia. A banda inglesa parecia gritar “anos oitenta” a cada acorde que tocava. E o músico americano, ícone do hard rock, voltou ao palco com sua conhecida identidade grotesca.
Sangue, decapitações e situações de terror. O mesmo circo de horrores que Cooper consagrou em apresentações de rock ele repetiu no palco Sunset. O que é a marca desse músico e ator, porém, ainda surpreende o público, que se manifesta com gritos cujos sentidos vão do gozo ao deboche.
Os elementos teatrais não ficam em primeiro plano. Cooper dividiu palco com músicos que exibem virtuosismo. Dos solos extensos e numerosos, sobressaiu o da guitarrista Nita Strauss, logo no início do show. Integrante da banda de hard rock Femme Fatale, ela substituiu Orianthi em turnê de 2014 e permaneceu na banda que acompanha Cooper em seus shows.
A apresentação começou com “Brutal Planet”, música que integra álbum homônimo. Depois ele retomou hits mais antigos, como “Under My Wheels” e “Poison”. Lançada em 1989, esta última tornouse uma espécie de hino.
Sobre o palco, o teatro de Cooper neste show incluiu uma aranha e uma teia de aranha gigantes, bolas de sabão, fogos de artifício, fumaça. O músico troca de figurino diver- sas vezes, passa de mágico a açougueiro, depois vira professor de escola primária.
O show encerrou com a bandeira dos EUA ao fundo pichada de preto (ou seria suja de petróleo?), ao som do hit “School’s Out”. Foi o auge da apresentação.
O calendário avançou só uma geração com a entrada em cena do Def Leppard. Liderados pelo vocalista Joe Elliot —um dos membros originais da banda, ao lado do baterista de um braço só, Rick Allen—, os ingleses entraram no palco Mundo às 22h30, ao som de “Let’s Go”, uma das muitas canções que seguem sua fórmula vencedora: melodia para balançar a cabeça, calcada em riffs de guitarra, e um refrão facilmente cantável.
O repertório, como seria de se supor, privilegiou o principal disco da banda, “Hysteria” (1987), de onde saíram canções como a faixa-título e a balada “Love Bites”. O rock datado, mas bem feito, do Leppard não chegou exatamente a incendiar a plateia, mas serviu de bom entretenimento para aguardar a principal atração da noite, o Aerosmith, que se apresentaria após a conclusão deste texto.
Antes dos roqueirões, duas atrações largamente desconhecidas do grande público —o duo anglo-americano The Kills e os brasilienses do Scalene— foram responsáveis por abrir a temporada de barulho. O quarteto Scalene despertou a atenção de curiosos com seu rock energético no Mundo. Mais rodado, o The Kills, com cinco álbuns e mais de 15 anos de carreira, levou seus sons distorcidos ao palco Sunset.
Voltando ao Brasil após uma série de shows em 2011, o duo formado pela americana Alison Mosshart, 38, e pelo britânico Jamie Hince, 48 fez uma apresentação que deixou de fora alguns de seus principais hits (“The Good Ones”, “Cheap and Cheerful”), mas que agradou a seus (poucos) fãs presentes.
Abrindo o dia, a paulistana Ana Cañas criticou a liminar da ‘cura gay’ e pediu “fora, Temer”. (AMANDA NOGUEIRA, GUSTAVO FIORATTI E MARCO AURÉLIO CANÔNICO)
Álbum de uruguaio é lançado nesta sexta
‘Eu não sou daqui, mas tu tampouco és”, canta o uruguaio Jorge Drexler em “Movimiento”, música de abertura de “Salvavidas de Hielo”, disco que começa a ser vendido nesta sexta-feira (22) nas formas física e digital.
Não é a primeira vez que Drexler, vivendo há duas décadas em Madri e com 13 álbuns lançados, trata de migração em suas composições. Mas o tema rejuvenesce em 2017.
“Eu tinha escrito canções mais diretas, mas queria um ângulo diferente para falar sobre esse assunto trágico. Um dia havia deixado meus filhos na escola, entrei no carro e liguei o rádio. O entrevistador pedia a um escritor cujo nome não escutei que falasse sobre seu último livro, que tratava de ‘acontecimentos migratórios’. Desliguei na hora. Encontrei nessa expressão uma maneira de falar de migração que não fosse panfletária”, diz o músico.
Esse não é o único assunto que volta às composições mais recentes. “Eu penso que faço coisas novas, mas acabo voltando às mesmas duas ou três canções. A personalidade artística está muito vinculada ao universo pessoal, e ele é bastante fechado. Você repete coisas.”
Nas repetições estão “Telefonía”, na qual o uruguaio celebra as várias formas de comunicação que trazem as mensagens de pessoas queridas, seguida de “Silencio”, sobre os poucos momentos de silêncio que nos restam em meio à balbúrdia de um mundo hiperconectado.
As duas foram lançadas em agosto, em apresentações ao vivo por Facebook e Instagram, redes sociais que Drexler frequenta de forma ativa.
“Não foi uma casualidade que lancei primeiro ‘Telefonía’, que é sobre alegria, e depois ‘Silencio’. A realidade não é linear. Muitas vezes você odeia o telefone, e outras não consegue viver sem.”
Também para fazer oposição aos excessos —e à sonoridade que vinha imprimindo a seus trabalhos anteriores—, as novas músicas foram gravadas apenas com violões (e guitarras).
Drexler avisa, porém, que isso não se repetirá nos shows. “O disco é de laboratório. É impossível reproduzi-lo ao vivo.” A turnê começa em Montevidéu no dia 4 de outubro, mas só deve chegar ao Brasil em abril de 2018, em data não confirmada.
Depois de ter dividido o microfone com Caetano Veloso no disco lançado em 2014, Drexler elegeu apenas vozes femininas para “Salvavidas de Hielo”.
São elas as mexicanas Julieta Venegas e Natalia Lafourcade e a chilena Mon Laferte. Para o uruguaio, elas são o “eixo forte” do disco.
“Elas combinam muito a popularidade com a qualidade”, diz o músico.
Mas ele afirma que as participações não são apenas femininas, ao contrário do que a audição do álbum faz parecer. Nos violões, Drexler convidou o também mexicano David Aguilar.
A explicação para a quantidade de convidados daquele país é simples: as músicas foram gravadas lá. ARTISTA Jorge Drexler GRAVADORA Warner Music QUANTO R$ 39,90 (CD); disponível também nas principais plataformas digitais