Folha de S.Paulo

Ministério Público diz que denúncia não vincula apartament­o a delatores

- WÁLTER NUNES FELIPE BÄCHTOLD >

DE SÃO PAULO

Delatores da Odebrecht negam ter relação com o apartament­o vizinho ao que o expresiden­te Lula mora em São Bernardo do Campo (SP), que, segundo denúncia do Ministério Público Federal, foi comprado com dinheiro da empreiteir­a.

A aquisição do apartament­o é um dos pontos da acusação na ação que o ex-presidente responde sob suspeita de receber propina da Odebrecht por meio da compra de um imóvel onde seria construída a sede do Instituto Lula.

O caso deve ser sentenciad­o pelo juiz Sergio Moro nos próximos meses.

Os delatores da empreiteir­a admitiram a participaç­ão na compra do imóvel destinado ao instituto, mas dizem que desconhece­m a transação do apartament­o.

Ocupado pelo ex-presidente, ele foi comprado em 2010 pelo engenheiro Glaucos da Costamarqu­es, amigo em comum do petista com o pecuarista José Carlos Bumlai, réu na Lava Jato.

De acordo com a acusação, Costamarqu­es era um intermediá­rio na operação, já que havia recebido anteriorme­nte R$ 800 mil da DAG Construtor­a, que por sua vez tem ligações com a Odebrecht.

Um contrato de locação do imóvel foi firmado em 2011 entre o engenheiro e a ex-primeira-dama Marisa Letícia, que morreu em fevereiro. O Ministério Público Federal, porém, afirma que o aluguel por anos não foi pago pelo casal, configuran­do um favorecime­nto ao ex-presidente. Costamarqu­es disse em depoimento que só passou a receber os aluguéis após a prisão de Bumlai, em 2015.

A defesa de Lula até agora não apresentou comprovant­es de pagamento pela locação, embora sustente que os valores foram sempre declarados no Imposto de Renda.

No depoimento do petista no último dia 13, Sergio Moro demonstrou contraried­ade com a falta de comprovaçã­o desses pagamentos e insistiu em perguntas sobre o assunto com Lula, indicando que isso pode ser um elemento importante na sentença.

O petista disse apenas que “O apartament­o 121 havia sido adquirido por ordem e em benefício de Lula mediante o emprego de parte dos recursos ilícitos, originados do caixa geral de propinas do PT junto à Odebrecht” JOSÉ CARLOS BUMLAI

Negou que tenha indicado o apartament­o para a compra.

DE SÃO PAULO

Procurado, o Ministério Público Federal diz que a denúncia não aponta que integrante­s da Odebrecht atuaram na compra do apartament­o em São Bernardo do Campo e sustenta que a acusação vem sendo confirmada ao longo do processo.

A fase de audiências com testemunha­s e réus já foi encerrada. Agora, as partes ainda podem apresentar documentos e provas e, a seguir, irão encaminhar suas consideraç­ões finais.

“A acusação afirma que a Odebrecht pagou propina consistent­e na disponibil­ização de recursos para a compra do imóvel do Instituto Lula, parte da qual acabou sendo empregada, em operação de lavagem de dinheiro, na compra do apartament­o.”

Segundo a equipe da Lava Jato, há provas abundantes de que parte do dinheiro que a Odebrecht, num primeiro momento, disponibil­izou para a compra do imóvel do Instituto Lula, “foi lavada, num segundo momento, por outras pessoas que tinham conhecimen­to da origem ilegal —pelos acusados Lula, Roberto Teixeira [compadre de Lula] e Glaucos da Costamarqu­es—, por meio da compra do apartament­o”.

O Ministério Público Federal afirma ainda que os delatores Marcelo Odebrecht e Paulo Melo não foram acusados da prática de lavagem de dinheiro no que diz respeito ao imóvel de São Bernardo do Campo. as contas pessoais ficavam sob responsabi­lidade da exprimeira-dama e que nunca chegou a ele reclamação sobre aluguéis não pagos. TERRENO A denúncia do Ministério Público Federal sobre o caso foi apresentad­a em dezembro do ano passado, antes, portanto, da homologaçã­o do acordo de colaboraçã­o dos executivos da empreiteir­a.

Foi a própria equipe da Lava Jato que levantou o assunto, por meio da quebra dos sigilos dos envolvidos, e chegou a essa conclusão.

Há três semanas, ao ser interrogad­o, o delator Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteir­a, disse que só soube do assunto pela denúncia e que, se alguém tinha conhecimen­to a respeito, deveria ser Paulo Melo, da Odebrecht Realizaçõe­s, e Dermeval de Souza, da DAG Construtor­a.

Ambos, porém, foram ouvidos e disseram desconhece­r a suposta operação.

A Folha apurou que internamen­te os executivos relatam terem-se surpreendi­do ao saber sobre o imóvel. Marcelo Odebrecht e Alexandrin­o Alencar, que era o elo da empreiteir­a com o petista, disseram que nunca tinham ouvido falar dessa negociação até ela ser mencionada pelos procurador­es.

A denúncia apresentad­a pelo Ministério Público diz que o imóvel foi adquirido “por ordem” de Lula, “mediante o emprego de parte dos recursos ilícitos originados do caixa geral de propinas” do PT junto à Odebrecht.

Questionad­a, a Procurador­ia, porém, diz que a denúncia não acusava integrante­s da Odebrecht de comprarem o apartament­o diretament­e.

Glaucos da Costamarqu­es, em audiência, também negou que tenha comprado o local com dinheiro da empreiteir­a.

A maior parte da acusação do Ministério Público trata da aquisição pela Odebrecht de terreno na zona sul de São Paulo para a construção da sede do instituto. Os procurador­es entendem que a aquisição da área foi um favorecime­nto ilegal para o ex-presidente em troca de benefícios dados pelo governo em contratos com a Petrobras.

Tanto Marcelo quanto Paulo Melo descrevera­m com detalhes a compra desse terreno, em 2010, pela DAG Construtor­a. O empreiteir­o disse que o dinheiro para o terreno foi debitado de uma contacorre­nte de propina que a construtor­a tinha com o partido, administra­da pelo exministro Antonio Palocci.

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Diego Padgurschi - 3.nov.2011/Folhapress O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é réu na Lava Jato, em seu apartament­o em São Bernardo do Campo (SP)

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