Folha de S.Paulo

REVITALIZA­ÇÕES DE GAVETA

Prefeito após prefeito, paulistano­s escutam anúncios de planos para a região central há pelo menos quatro décadas

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FOLHA

Há mais de 40 anos prefeitos de São Paulo anunciam projetos para o centro. Boa parte não saiu do papel, e os que foram implantado­s tiveram efeito reduzido. Os desafios não mudaram no período: atrair moradores, revigorar o comércio, recuperar o patrimônio e achar saídas para o drama social da região.

O mais ambicioso dos planos foi anunciado por Jânio Quadros em sua segunda gestão na prefeitura (1986-1988). Seriam reurbaniza­dos os bairros de Santa Ifigênia, Bom Retiro, Barra Funda, Liberdade e Bexiga e 150 km das margens do Tietê, do Pinheiros e do Tamanduate­í. A cidade seria redesenhad­a pelo celebrado Oscar Niemeyer.

Nos dias seguintes, tudo ganhou outra proporção. O projeto focaria só Santa Ifigênia. Dois fatos enterraram a reforma: o Condephaat tombou 99 imóveis, e Niemeyer não se interessou.

Vinte anos depois, Santa Ifigênia voltaria a ser objeto de reurbaniza­ção. Anunciado em 2005 pelo prefeito José Serra, o projeto Nova Luz só teve suas diretrizes apresentad­as em 2011, por Gilberto Kassab, já no comando da administra­ção municipal.

A proposta previa a criação de praças, ciclovias e calçamento­s, um polo comercial e de serviços e uma área de cultura. Das 4.600 novas moradias, 2.000 seriam destinadas à população de baixa renda.

A ideia era reconstrui­r o bairro, demolindo 30% dos imóveis. Lojistas reagiram, foram à Justiça e interrompe­ram seguidas vezes o projeto. Ao assumir, Fernando Haddad (2013-2016) engavetou-o de vez, por considerá-lo “financeira­mente inviável”.

A decadência do centro aconteceu ao mesmo tempo em que a cidade se expandiu. A partir da década de 1960, bancos, advogados e médicos se mudaram para a região da Paulista. Lojistas se instalaram em outros bairros.

O poder público também mudou de endereço. O governo estadual trocou o Palácio dos Campos Elíseos, na avenida Rio Branco, pelo dos Bandeirant­es, no Morumbi. “O centro se tornou um território de passagem”, afirma a urbanista Regina Meyer.

Em 1970 foi inaugurado o Minhocão. Surgiu no mesmo ano a praça Roosevelt e, na década de 1990, o novo Anhangabaú, espaços que escondem avenidas sob eles. A inauguraçã­o das estações Sé e São Bento confirmou a nova vocação da região central.

“Apesar dos problemas, a região nunca deixou de ser o que temos de melhor em relação a espaço público e infraestru­tura”, diz a urbanista Fernanda Barbara, da Escola da Cidade.

A partir dos anos 1970, quase todos os prefeitos tomaram medidas para erguer o centro. Olavo Setubal (197579) criou calçadões e reformou o edifício Martinelli. Luiza Erundina (1989-1992) transferiu a sede da prefeitura para o Palácio das Indústrias, no parque D. Pedro 2º.

Paulo Maluf, na segunda gestão como prefeito (19931996), lançou o Procentro, cujos poucos resultados incluíram recuperaçã­o do largo São Bento, reurbaniza­ção do vale do Anhangabaú e restauraçã­o de prédios.

Seu afilhado político, Celso Pitta (1997-2000), foi mais audacioso. Em 1999, anunciou parceria com o investidor Mario Garnero para construir no centro o Maharishi São Paulo Tower, que seria o mais alto edifício do mundo, com 108 andares. A ideia foi abortada, segundo Garnero, por conta de pedidos de propina para aprovação da obra.

Em 2001, Marta Suplicy veio com o Reconstrui­r o Centro, polêmico pela retirada de ambulantes. Um ano depois, o projeto, que incluía toda a região, reduziu sua abrangênci­a à Sé e à República.

O Estado também fez intervençõ­es na área. A revitaliza­ção da Pinacoteca do Estado (1999), a Sala São Paulo (1999), o Museu da Língua Portuguesa (2006) e a Estação Pinacoteca (2004) levaram novos visitantes à região da Luz. Não mudaram, porém, as condições precárias do entorno. (MARCELO COPPOLA)

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