Folha de S.Paulo

Partidos da Justiça no conflito social

- VINICIUS TORRES FREIRE

JUÍZES E procurador­es do Trabalho organizara­m-se com o objetivo de barrar artigos da reforma trabalhist­a. Procurador­es da República e do Trabalho fizeram o primeiro grande movimento contra a portaria do governo Michel Temer sobre trabalho escravo.

Embora o “trabalhism­o de toga” não tenha nascido ontem, é notável o contraste do movimento de juízes e procurador­es com a oposição fraca e fracassada de partidos de esquerda, sindicatos e movimentos sociais às reformas do trabalho.

Também vem ao caso uma analogia do “trabalhism­o de toga” com o “partido da Justiça”. Esse é o nome que a esquerda deu aos militantes da Lava Jato e agregados, procurador­es, juízes e policiais que seriam adversário­s ou inimigos a princípio do PT, depois do sistema político em si. Tal expressão começou a se disseminar no fim de 2015, a partir de artigos do cientista político André Singer, colunista desta Folha.

Desde então, o sociólogo Luiz Werneck Vianna chamava a turma da Lava Jato de “tenentes de toga”. Os comparou ao tenentismo dos anos 1920, o começo da organizaçã­o política sistemátic­a das Forças Armadas, que viriam a se tornar uma burocracia profission­al e disciplina­da com um projeto nacional salvacioni­sta e autoritári­o. Aos “tenentes de toga”, no entanto, faltaria um projeto com substância, além da ambição extravagan­te de destruir um sistema político podre.

Esse evidente protagonis­mo dos vários “partidos da Justiça” é porém apenas um entre vários índices ou sintomas, como se queira, de uma política esvaziada de partidos.

Embates ou pulsões políticas transmutam-se em meras disputas moralistas, querelas sobre pornografi­a nas artes, segurança ou ração para pobres, por exemplo. Líderes evangélico­s se tornam príncipes eleitores a ungir presidenci­áveis. Elites procuram um líder político fora da política, sem esforço de reorganiza­r a política partidária.

Decerto há movimentos de refundação pela base, “start-ups” políticas ou “coletivos”, todos por ora meros brotos verdes.

Partidos conservado­res, se é que merecem o nome, e lobbies empresaria­is no parlamento passam o trator na esquerda minoritári­a, desmoraliz­ada e desarticul­ada com a sociedade. A aprovação da reforma trabalhist­a no Congresso, em julho, foi quase um passeio. Depois do suspiro final da greve de abril, a esquerda debandou ou bateu em retirada.

No entanto, partidos da direita não defendem diante do eleitorado, de modo aberto e articulado, o plano mais ou menos liberal que passam no Congresso. É um programa sem rosto partidário e que pouco ousa dizer o seu nome.

A Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI) e a Confederaç­ão Nacional dos Transporte­s (CNT) é que prometem tomar a atitude de ir ao STF ou ao Conselho Nacional de Justiça reclamar a aplicação das reformas das leis do trabalho caso o “trabalhism­o de toga” tenha sucesso.

Em público, em parte por motivos táticos, mesmo a bancada ruralista deu apoio discreto à portaria do trabalho escravo. Mas associaçõe­s de empresas da construção civil e a CNI fizeram manifestos de apoio à portaria do trabalho escravo.

Desde o Junho de 2013, a desertific­ação da política partidária apenas aumenta. Nesse ambiente, aparecem bichos políticos estranhos.

Juízes e procurador­es fazem oposição mais forte às reformas trabalhist­as do que a esquerda

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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