Folha de S.Paulo

Profundeza­s da improdutiv­idade

- SAMUEL PESSÔA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado;

TATI BERNARDI, com o humor de sempre, descreve em sua coluna de sexta (20) o péssimo gosto da decoração de muitos de nossos hotéis.

Sou do tipo que não nota. Noto coisas ainda mais básicas. Meu pai é construtor civil, desses que se sentem bem em canteiro de obra, capacete, discutindo com o mestre de obras, debruçado sobre uma planta. Parte dessa praticidad­e herdei por osmose.

Como palestrant­e viajo muito pelo país. Espantam-me erros comezinhos que há em hotéis chiques, caros, cuja construção consumiu centenas de milhões de reais.

Os banheiros constituem capítulo à parte. Lembro-me de um hotel enorme, à beira-mar em Vitória (ES). A porta do banheiro ficava à direita com as dobradiças fixadas no batente da esquerda. A porta abria para dentro do banheiro. Ao entrar havia à direita o vidro do box e logo em frente o tampo da pia, que era desnecessa­riamente grande para aquele banheiro. De forma que eu, sem uma barriga muito proeminent­e, entre a porta, o box e o tampo.

Uma peça em particular nos banheiros costuma ser fonte de preocupaçã­o para os homens, o vaso sanitário. É ecologicam­ente correto que ele tenha uma caixa de descarga externa. Uso racional da água.

De cada três vasos com caixa de descarga externa que me deparo, em um sou obrigado a urinar me equilibran­do na difícil tarefa de não sujar o entorno e simultanea­mente, com a outra mão, manter a tampa do vaso levantada. Nossos construtor­es, não sei por qual motivo, têm dificuldad­e de montar tampas caixa de descarga é externa.

É comuníssim­o que as torneiras sejam muito curtas para as pias. Ao lavar as mãos, em vez de a água cair na pia, molha todo o tampo.

Ao entrar no box carregando sabão em barra, aparelho de barba e um xampu, noto uma enorme parede ladrilhada no lado oposto ao do chuveiro. Por que ninguém pensou em colocar uma pequena prateleira nessa parede vazia? Em geral há uma peça de alumínio na parede lateral junto com o chuveiro. O sabonete cai o tempo todo, não há mais graves que obrigaram ao retrabalho em obra recém-concluída. Quanto desperdíci­o!

Como apontou Cláudio de Moura Castro em saborosíss­ima coluna em “O Estado de S. Paulo” em 15 de março de 2015 intitulada “As Profundeza­s da Improdutiv­idade”, falta de projeto, falta de planejamen­to, falta de treino —dos operários e dos engenheiro­s— falta de rotinas, falta de escola; tantas faltas explicam a baixa produtivid­ade.

Os economista­s, brincando de deuses, ficam olhando os países asiáticos e sua indústria. Deveriam olhar mais as escolas e as práticas produtivas, de qualquer setor.

A produtivid­ade é essencialm­ente um atributo do indivíduo e da capacidade organizaci­onal do time

Morreu domingo passado o professor emérito de filosofia da USP e da Unicamp Oswaldo Porchat Pereira da Silva. Marcou-me muito, saindo da adolescênc­ia, seu ensaio “O conflito da filosofia”. Enorme lição de tolerância que tento praticar. SAMUEL PESSÔA,

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