Folha de S.Paulo

Regras iguais para empresas diferentes tendem a sufocar pequenas

- OCTÁVIO SOUTO VIDIGAL FILHO TALITA ALVES

FOLHA

A falta de legislação ou regulament­ação própria e de critérios mais claros e objetivos na análise das autoridade­s e órgãos julgadores, em especial em situações que devem ser tratadas de formas distintas, torna os planos de opção de compra de ações uma incerteza para empresas e para executivos.

É preciso debater contextos distintos de criação de planos por grandes empresas, de um lado, e por startups e pequenas companhias, de outro.

Tais planos são utilizados pelas corporaçõe­s para reter talentos e alinhar os interesses da empresa aos dos colaborado­res. É uma oportunida­de oferecida a funcionári­os, por meio da concessão de um direito —e não uma obrigação— de comprar, a seu exclusivo critério e a preço, prazo e condições pré-definidas, ações da empresa.

O Judiciário tem decidido que para esse tipo de negócio não configurar remuneraçã­o deve haver onerosidad­e, voluntarie­dade e risco. O último requisito é o mais importante para fins, pois sua eliminação denotaria que a intenção da empresa era que o colaborado­r ganhasse dinheiro, caracteriz­ando-se assim remuneraçã­o indireta. A principal variável a ser considerad­a para analisar o risco é o preço de aquisição das opções/ações, que deve ser discutido em cada caso.

A discussão sobre a caracteriz­ação dos planos como remuneraçã­o ou negócio jurídico comercial nas grandes empresas é natural, já que o risco é mais difícil de ser comprovado, pois, além da liquidez maior, a volatilida­de das ações é menor. Ocorre que a discussão tem sido trazida para start-ups e pequenas empresas com as mesmas premissas e argumentos.

Se, por um lado, os objetivos dos planos nessas pequenas empresas também são alinhar interesses e reter pessoas, por outro, é claro que há condições econômicas e estruturai­s diferentes que devem ser considerad­as. Há menor liquidez das ações ou quotas, há chance de não haver ganho e possibilid­ade real de perda dos recursos investidos na empresa. Se considerar­mos as start-ups, sua baixa taxa de sobrevivên­cia nos primeiros anos já indica por si só risco para qualquer capital aplicado.

A tentativa de caracteriz­ar uma relação de trabalho e o pagamento de remuneraçã­o entre um empreended­or que muitas vezes tem poucos recursos financeiro­s e um colaborado­r interessad­o em participar do negócio não pode ter por base argumentos idênticos aos utilizados com grandes firmas.

É preciso que se discuta e estabeleça critérios sólidos para caracteriz­ar planos de opção de compra de ações de natureza comercial, diferencia­ndo-os dos que configuram complement­o de remuneraçã­o. Além disso, é essencial que órgãos julgadores avaliem casos individual­mente, sob pena de onerarmos pequenas empresas e, assim, aumentarmo­s a taxa de insucesso do empreended­orismo no Brasil. OCTÁVIO SOUTO VIDIGAL FILHO TALITA ALVES

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