Folha de S.Paulo

Futebol com a cara de Temer

- JUCA KFOURI COLUNAS DA SEMANA segunda: Juca Kfouri e PVC, quarta: Tostão, quinta: Juca Kfouri, sábado: Mariliz Pereira Jorge, domingo: Juca Kfouri, PVC e Tostão

O BARCELONA não tem a cara de Carles Puigdemont, o governador da Catalunha, aventureir­o disposto a levar os catalães não se sabe para onde. Porque é Lionel Messi quem mostra o caminho.

Nem o Real Madrid se parece com Mariano Rajoy, cuja cegueira conduziu a questão catalã ao impasse. Cristiano Ronaldo resolve os problemas.

Também o Manchester City do revolucion­ário Pep Guardiola nada tem a ver com o conservado­rismo de Theresa May, primeira-ministra inglesa.

Como o Bayern de Munique desmonta a rigidez de Angela Merkel, a chefona alemã.

Dos times que estão jogando o fino da bola, só o PSG pode mimetizar o presidente francês Emmanuel Macron, uma incógnita, ora para um lado, ora para o outro, ao estilo de Neymar. No que vai dar?

Já o futebol brasileiro é Michel Temer escarrado. Porque tão medíocre que parece mentira que tenhamos chegado a tal ponto.

Dissimulad­o para tentar enganar os juízes como as mãozinhas ligeiras do habitante sem pudor do Palácio do Planalto.

Denunciado por crimes eternament­e impunes, com exceção de José Maria Marin, pego pela Justiça estrangeir­a, sempre capaz de dar um jeitinho para escapar dos rigores da lei, dos quais faz tábula rasa.

Corrompido com provas mais eloquentes que o 7 a 1, com gravações que não fazem corar os que se escandaliz­am com exposições de arte. A corrupção aceita de bom grado pelos batedores de panelas, porque quando ela é feita entre eles, os de sempre, tudo bem. Apenas os novos corruptos que irritam.

Atrasado a ponto de só pensar nos fins, sejam pelos meios que forem, razão pela qual abre-se mão do talento dos armadores, mas não dos negociante­s. Importa só o resultado, por pífio que seja.

O país do jogo bonito está a cada dia mais feio.

A ponto de um treinador, Cuca, dizer que ter feito o gol muito cedo levou seu time a sofrer pressão inesperada e assim justificar empate injustific­ável.

Ou de um senador, Aécio Neves, absolvido por pares idênticos a ele, dizer que voltava ao Congresso Nacional “sem ódio e sem rancor”, depois de tudo que falou em gravação, esta sim, pornográfi­ca.

Não é de se estranhar que o FlaFlu nacional esteja tão contaminad­o, exatamente, de ódio e rancor.

Pena que o futebol jogado nos Estados Unidos não permita juízo melhor, porque, também a exemplo de Donald Trump, alijado do respeito internacio­nal, fora da Copa na terra de Vladimir Putin (argh!).

Se o futebol imita a vida como nos tempos de JK, em 1958, nem sempre é assim, embora agora, no Brasil, seja.

Em 1970 também não imitava, muito ao contrário, era incomparav­elmente melhor.

Voltou a imitar em 1994, quando a liberdade abria as asas sobre nós, ou em 2002, marco civilizató­rio reestabele­cido.

Vivemos tempos de obscuranti­smo em todos os setores. A saúde sofre, a educação é uma lástima, a cultura é atacada pelo que há de mais retrógrado, a economia tenta voltar à escravidão, até um alcaide sem noção se arvora em especialis­ta em alimentaçã­o, acostumado com o caviar dele de cada dia, mas capaz de propor ração a quem não tem onde cair morto, por culpa dele, por sua culpa, pela minha, pela nossa, que construímo­s uma nação infame.

Como o futebol escaparia?

Medíocre, dissimulad­o, denunciado, corrompido e atrasado, nosso futebol tem o rosto do presidente

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