Clássico opôs clube da polícia e time do povo
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O futebol na era soviética deve grande parte de seu desenvolvimento e popularidade ao clássico moscovita entre Dínamo e Spartak. O jogo resumia o choque entre o clube da polícia e o time do povo, respectivamente.
A rivalidade entre eles começou a se acirrar em 1935, quando Nikolai Starostin, jogador de enorme sucesso no país, que já havia capitaneado as seleções de futebol e de hóquei, resolveu assumir o controle do então Promkooperatsiya. Ao lado de seus três irmãos, o renomearam Spartak.
Ao mesmo tempo, Starostin se aproximou de Alexander Kosarev, chefe da Komsomol [organização da juventude do Partido Comunista]. O órgão disputava o controle do esporte com as forças de segurança, que tinham no Dínamo seu maior expoente. O clube teve a partir de 1936 como presidente honorário o georgiano Lavrenti Beria, chefe da polícia secreta (NKVD) e braço-direito de Josef Stálin (1878-1953).
Beria foi o responsável pela prisão em 1938 de Kosarev, que seria executado. Depois disso, passou a perseguir os irmãos Starostin.
Sua fúria aumentava à medida que o Spartak vencia —foram três títulos da liga soviética, contra dois do Dínamo em cinco edições.
A popularidade alcançada pelo clube forjou a alcunha de “Time do Povo”.
A equipe era formada por trabalhadores simples que vinham das camadas populares, enquanto os atletas rivais tinham cargos administrativos e patente militar.
“O Spartak pode ter provocado um antagonismo de classes, mas era popular por uma razão muito mais convencional: o time era bom”, escreveu o historiador norte-americano Robert Edelman no livro “Uma Pequena Maneira de Dizer Não”.
Um episódio que deixou Beria ainda mais furioso ocorreu na semifinal da Copa Soviética de 1939 quando o Spartak venceu o Dínamo Tbilisi por 1 a 0 com um gol polêmico e avançou para a final, superando o Leningrad Stalinets por 3 a 1.
Mesmo após a decisão, ordens vindas do governo forçaram a realização de nova partida entre Spartak e Dínamo. Nova vitória do time de Starostin por 3 a 2.
A rivalidade só aumentava. Em 1942, Nikolai e seus irmão foram presos e acusados de diversos crimes.
De acordo com as autoridades, eles estavam impondo práticas burguesas no esporte, aproximando-o do capitalismo. Outro processo os apontava como conspiradores de um plano para assassinar Stálin.
Como pena, foram condenados a dez anos em campos de trabalho forçado na Sibéria. Em 1955, dois anos após a morte de Stálin e a execução de Beria, Kosarev voltou a Moscou e presidiu o Spartak até 1992. Morreu quatro anos depois.
Após o fim da União Soviética, o Dínamo perdeu muito de seu poderio e na “nova Rússia” jamais voltou a ganhar um título nacional. Na temporada 2016/2017, pior: jogou a segunda divisão pela primeira vez.
Já o Spartak se manteve como grande e ganhou mais dez títulos nesta nova era.