Feliz Dia das Bruxas, amigas
IMAGINE UMA bruxa. Queixo e nariz alongados, boca murcha e dentes faltando, cabelos grisalhos e desgrenhados, pele enrugada, mãos com veias à mostra e maltrapilha. Qualquer semelhança com a descrição de uma mulher envelhecida, que não tem acesso ao caríssimo arsenal de guerra para parecer mais jovem, não é mera coincidência. Por outro lado, se tivesse que imaginar um bruxo, provavelmente viria à mente o mago Merlin ou o saudoso Dumbledore de “Harry Potter”. Feios e encarquilhados, mas muito mais próximos da imagem de vovozinhos queridos.
Desde que o mundo é mundo, a juventude e os atrativos físicos têm sido considerados grandes atributos da mulher. Ainda hoje, quando a mulher conquistou um lugar social que ultrapassa muito o papel de objeto sexual ou reprodutor, a discrepante valorização entre a beleza masculina e feminina chega às raias do ridículo. Basta assistir um filme, no qual um obeso, envelhecido e nada charmoso Gérard Depardieu faz par romântico com uma linda e jovem mulher, para termos um exemplo das diferentes medidas que estão em jogo aí.
Não se trata aqui de levantar a bandeira da “queima de sutiãs” (que nunca foram queimados, por sinal) dos anos 1960, pois a vaidade humana pode se disfarçar no orgulho em ser despojada (quem convive com jovens sabe que leva quase uma hora para parecer que eles não estão “nem aí” para a aparência). Trata-se de reconhecer beleza para além da juventude, quando se A relação com as filhas crescendo pode nos revelar a forma como cada mulher lida com seu o envelhecimento trata da mulher. Do lado dos homens, não menos exasperante, estão as expectativas como provedor de bens materiais (mas esse assunto fica para outro dia).
O belo sempre será pautado pelos ditames sociais e nossos olhos mudam de opinião ao sabor dos tempos, das novas mentalidades e da ditadura da moda. O grisalho, por exemplo, que é visto como sexy nos homens (George Clooney, eu sei, concordamos), começa a aparecer na cabeça das mulheres como uma opção de beleza também. Para além dos modismos francamente direcionados para o consumo, é digno de nota esta mudança no olhar, posto que o cabelo grisalho passa a ser visto como desejável nas mulheres.
A relação com as filhas crescendo também pode nos revelar a forma como cada mulher lida com seu o envelhecimento. Algumas assumem uma franca hostilidade contra o desabrochar sexual das meninas, outras tentam reviver uma adolescência já perdida e vão na cola das jovens vivendo a vida delas. Outras engravidam justo quando estavam prestes a entrar na menopausa. Temos os lutos esperados, por um lado, e as depressões e sintomas, por outro. Enfim, os truques são muitos, os sofrimentos também. Muitas mulheres, tendo passado por tudo isso, ao encontrar em si valor para além da juventude e da maternidade, celebram o fato de estarem vivas e o frescor que o convívio com as filhas pode trazer, ainda que não seja simples.
Recentemente, na festa de 90 anos de minha mãe, surpreendi-me com um gesto dela nada corriqueiro. Pela primeira vez desde que me lembro, minha mãe foi a um salão de beleza e fez uma discreta maquiagem. Esta vaidade insuspeita e tardia revelou-me seu prazer de sentirse viva e de sentir-se bela por isso. Para uma pessoa que está encarando a própria velhice, como eu, essa pode ser uma lição preciosa.