Irmã quer tirar biografia de Belchior de circulação
Ângela Belchior, que deve lançar livro sobre cantor, diz que obra é ‘mentirosa’
Para Jotabê Medeiros, críticas a sua obra são represália por ele negar tese conspiratória sobre o sumiço do músico
Quando Belchior morreu, em abril deste ano, encerrando o mistério sobre seu paradeiro, uma biografia do cantor já havia sido escrita, mas ganharia, a partir dali, seu capítulo final antes de ser publicada pela Todavia, quatro meses mais tarde, em agosto.
“Apenas um Rapaz LatinoAmericano”, de Jotabê Medeiros, se tornaria pouco depois alvo de críticas feitas por Ângela Belchior, irmã do cantor.
“[O livro] é ofensivo à nossa honra e principalmente à honra de Belchior, que não está mais presente fisicamente na Terra”, diz a socióloga Ângela Belchior, que, ao lado do advogado Estêvão Zizzi, pretende lançar a própria versão da vida do irmão em outubro do ano que vem, quando ele completaria 72 anos.
“Estamos pegando depoimentos porque a gente não quer uma biografia mentirosa para as gerações vindouras”, diz a irmã do músico.
Ela contesta trechos como o que cita um confronto entre Belchior e um decano não identificado da Faculdade de Medicina de Porangabuçu, em Fortaleza, que teria chamado o aluno de “medíocre”.
Para Ângela, no entanto, o trecho “mais ofensivo entre todas as questões ofensivas” é o que, em sua interpretação, negaria a participação de sua mãe em coral de igreja.
A passagem em questão fala sobre mitos que rodeiam a imagem do ídolo, como “narrativas heroicas que o reportam como ex-cantador de freiras”, por exemplo.
“Tudo cascata. Mãe que cantava em coral de igreja? Essa era uma história típica da mitologia dos artistas negros evangélicos norte-americanos, mas que não batia com a rotina eclesiástica das igrejas do Nordeste brasileiro”, diz o trecho do livro.
Para Jotabê Medeiros, os aspectos citados por Ângela revelam versões discordantes de fontes e, em alguns casos, falhas de interpretação.
“Não estou dizendo que a mãe dele não cantava na igreja, estou dizendo que a tradição da Igreja Católica brasileira é diferente da igreja evangélica, que tem uma tradição mais apurada nesse sentido, o que fundamenta a tradição de cantores de blues americanos”, explica Medeiros. CONSPIRAÇÃO Para ele, as críticas são uma represália por ele discordar da opinião de Ângela sobre o sumiço do cantor.
“Ela acha que todo o pessoal que abrigou o Belchior no Rio Grande do Sul fazia parte de uma grande conspiração para mantê-lo refém”, diz. “Discordo, dentro da minha investigação não achei fundamento para dizer esse tipo de coisa e na biografia digo que acho inverossímil.”
O autor também aponta diferenças entre a intenção da obra dele e a da que Ângela e Zizzi escreverão: “Eles têm como ponto de partida ser uma biografia oficial, a minha é não autorizada, partimos de princípios distintos.”
A nova biografia será narrada em primeira pessoa, a partir de uma entrevista feita com o cantor em Iracema, no Ceará, em 2005, e incluirá depoimentos de amigos e fãs.
Segundo Zizzi, o livro falará também do “suposto ‘sumiço’” do cantor e das três versões que sua mulher, Edna Prometheu, teria dado sobre a morte dele. A Folha tentou entrar em contato com Prometheu, mas não a encontrou.