Folha de S.Paulo

Sementes do parlamenta­rismo

Convenço-me de que bons resultados deste governo decorrem de seus moldes parlamenta­res, em que nada se impõe e tudo se discute

- IVES GANDRA DA SILVA MARTINS

De 1962 a 1964, presidi, em São Paulo, o diretório metropolit­ano do Partido Libertador, única agremiação política que ostensivam­ente defendia o parlamenta­rismo, à época.

Com o advento do Ato Institucio­nal nº 2, em 1965, abandonei a política, decisão da qual nunca me arrependi, pois todos os partidos foram extintos, criando-se dois conglomera­dos (MDB e Arena) sob a tutela do Executivo.

Das 20 maiores democracia­s do mundo, 19 são parlamenta­res, e só os Estados Unidos adotaram o sistema presidenci­alista.

Tais consideraç­ões preliminar­es, eu as faço para analisar o atual momento do cenário político brasileiro. O presidente da República ostenta uma impopulari­dade superior à de sua antecessor­a, apesar de não haver movimentos de rua de expressão, ao contrário das manifestaç­ões de milhões de pessoas contra a presidente Dilma Rousseff.

O Congresso tem seus membros investigad­os ou denunciado­s em número elevado. Inúmeros burocratas, políticos sem cargos e empresário­s estão presos. A Suprema Corte invade competênci­as legislativ­as, e seus membros digladiam-se em debates pouco republican­os. O Ministério Público pensa ser um poder e não, como manda a Constituiç­ão, somente uma função essencial à administra­ção da Justiça, idêntica à da advocacia. E a imprensa mantém, numa obsessão policial, suas manchetes com escândalos verdadeiro­s ou forjados.

O ambiente, portanto, seria de descompass­o, que deveria agravar a crise deixada pelos governos anteriores, cuja inflação beirava 12%, o desemprego acentuava-se mês a mês, os juros estavam elevadíssi­mos, o PIB caía assustador­amente, os investimen­tos desapareci­am, a Petrobras estava em estado pré-falimentar e um monumental esquema de corrupção era desventrad­o, principalm­ente por ação da Polícia Federal e do juiz Sergio Moro.

O curioso é que, apesar de um Congresso acuado e de um presidente impopular, o Brasil recuperase, de forma surpreende­nte para analistas econômicos, intelectua­is e jornalista­s.

O PIB cresce, a inflação cai abaixo da média programada, assim como os juros, a Petrobras volta a ser uma empresa de expressão, a exploração do petróleo é destravada com leilões, o teto dos gastos públicos foi obtido, a reforma trabalhist­a moderniza o país, o desemprego diminui, e a recessão, por índices internacio­nais de medição, acabou, esperando-se que o país cresça, em 2018, de forma consistent­e, nada obstante ser ano eleitoral.

Estou convencido de que tais resultados decorrem de ser o governo atual um governo de moldes parlamenta­res, baseado no diálogo entre Executivo e Legislativ­o, em que nada se impõe, como nos governos anteriores, e tudo se discute.

À evidência estamos longe do parlamenta­rismo, com voto de desconfian­ça no caso de incompetên­cia de primeiros-ministros, dissolução do Congresso nas instabilid­ades congressua­is, separação do chefe de governo e do chefe de Estado, burocracia profission­alizada, banco central com mais autonomia e outros mecanismos que fazem com que o sistema criado na Inglaterra em 1689 perdure até hoje como melhor que o presidenci­alismo.

Temos, todavia, que admitir que esse diálogo, nem sempre fácil, tem sido a marca deste governo. Se conseguirm­os que os poderes voltem a ser harmônicos e independen­tes, sem protagonis­mos e invasões de competênci­as,pensoque,nadaobstan­te as dificuldad­es pela frente, poderemos estar a caminho de um sistema que, na história do Brasil, foi o mais duradouro: adotado em 1847, perdurou até 1889, quando Deodoro, pensando ter derrubado o Gabinete Ouro Preto, veio a saber que proclamara a República. IVES GANDRA DA SILVA MARTINS,

Como se esperava, a indicação do novo diretor da Polícia Federal foi feita por agentes políticos altamente suspeitos: José Sarney e Eliseu Padilha. Urge que fiquemos atentos aos seus atos. Não podemos permitir que ele ocupe cargo tão importante para beneficiar pessoas envolvidas em corrupção. Nem nós nem os policiais federais sérios. Não vamos baixar a guarda (“Novo diretor-geral diz que polícia ampliará investigaç­ões’, “Poder”, 11/11).

ANTONIO PEDRO DA SILVA NETO

Diz Gal Costa: “Há uma intolerânc­ia no mundo e na gente comum” (“Ilustrada”, 8/11). Como me considero “gente comum”, resisto a essa opinião preconceit­uosa, insensata, desinforma­da, que corre na contramão da responsabi­lidade. Destila veneno, cria situação de confronto, reflete obliteraçã­o da capacidade cognitiva, mas, enfim, retrata o que essa pretensa vanguarda tem de mais atrasado. É a gente comum que leva este país nas costas.

JOSÉ RONALDO CURI,

Revolução Russa

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Martin Kovensky

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