Folha de S.Paulo

Geraldo, um brasileiro do andar de baixo

- ELIO GASPARI

CORONEL NEVES A carteirada com que Aécio Neves depôs o senador Tasso Jereissati da presidênci­a do PSDB obrigou o tucanato a parar de fingir que lida com o Aecinho, neto de Tancredo Neves, menino de praia e freguês da noite do Rio.

Aécio é um coronel. Como senhor das Gerais, manteve a imprensa mineira sob uma pressão sem paralelo entre os grandes Estados. Podendo, dava uma passadinha pelo circuito chique-brega de Paris.

O coronel Aécio mostrou seu chapéu na maneira como enfrentou a denúncia de que construíra um aeroporto na cidade de Cláudio para atender as conveniênc­ias de sua família. TEMER E AS ÁGUAS Michel Temer disse o óbvio: se a reforma da Previdênci­a não passar pelo Congresso, paciência. O “mercado” desabou, como se ele tivesse dito alguma novidade.

Desde antes do grampo do Jaburu sabia-se que a reforma apresentad­a em dezembro passado estava contaminad­a pelo excesso de bodes. Se ela passasse com a idade mínima e o regime único, seria um êxito para ninguém botar defeito.

Em vez de atirar pedras em Temer, o “mercado” deveria reconvocar os çábios, consultore­s e especialis­tas que lhe venderam a ideia da viabilidad­e do pacotão. Na sua versão original, a proposta cortava 50% do valor de todas as pensões por morte do INSS.

Temer está numa situação parecida com a do presidente americano George Bush, o Velho, quando ele apanhava por tudo o que fazia e um dia comentou: “Se eu andar sobre as águas, dirão que não sei nadar”.

Geraldo Casalli tem 53 anos, é motorista da Viação Suzantur, de São Carlos (SP), onde ganha R$ 1.900 mensais, com carteira assinada. Às 12h30 do domingo passado, ele chegou ao ponto final de seu percurso com 15 jovens aflitos que iam para a prova do Enem. Uma garota contou-lhe que estavam a quarteirõe­s de distância e corriam o risco de perder a hora. Pediulhe que espichasse sua rota, levando-os até o local da prova. Ele pensou nas duas filhas, Ana Claudia e Dayane, e atendeu-a.

No dia seguinte, a história de Geraldo estava na rede. Ele foi elogiado pela Suzantur e a empresa anunciou que hoje mudará o percurso de quatro de sua linhas, levando estudantes aos portões da prova.

Geraldo Casalli é um grande brasileiro. Não só pelo que ele fez no domingo passado, mas também pela sua história. Sempre trabalhou como caminhonei­ro, mas nunca teve caminhão. Trabalha há nove meses na Suzantur, depois de ter ficado um ano desemprega­do, vivendo de bicos. Sua mulher é zeladora num colégio, com pouco mais de R$ 1.000 de salário. Vivem numa casa modesta, porém própria. O casal educou Ana Claudia e Dayane em escolas públicas e elas nunca repetiram ano. Ambas formaram-se em pedagogia. Uma, com 23 anos, tem mestrado e trabalha com crianças que têm necessidad­es especiais. Está noiva e deve se casar em 2019. A outra deve começar no primeiro emprego nas próximas semanas.

Dirigindo caminhão, Geraldo nunca foi assaltado, “graças a Deus”. No seu ônibus, já assaltaram o trocador.

Geraldo é um homem comum, com uma família comum e bem-sucedida. A quem lhe pergunta se em 53 anos de vida aconteceu-lhe alguma coisa que considere memorável, responde o seguinte: “Nada, só esse caso de domingo passado, mas eu não estava pensando nisso”. O JOGO DE PEZÃO O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, anunciou que ele e outros colegas estão trabalhand­o para aprovar a legalizaçã­o dos jogos de azar em Pindorama. Nas suas palavras: “Propusemos a legalizaçã­o dos jogos com a destinação dos impostos para criar um fundo de segurança pública”.

Tudo bem, legalizar a jogatina para engordar a receita de um Estado cujas finanças o doutor ajudou a quebrar. Por que não criar também a Póbrás, legalizand­o a cocaína?

Sabendo-se que o governo está de olho no dinheiro do jogo, entende-se que haja gente boa cheirando a pureza dessa ideia.

Ela é velha. Em 2011, ouvia-se o seguinte: “Eu acho que o jogo no Brasil, se aberto e legalizado, poderia ser uma fonte de financiame­nto importante para tanta coisa. Inclusive para saúde. Não se fala tanto em financiame­nto de saúde?”

Quem disse isso foi o governador­gestor Sérgio Cabral. Está na cadeia, condenado a 72 anos. Junto com ele, estão seu secretário de Saúde, doutor Sérgio Côrtes, e Miguel Iskin, grande fornecedor da rede hospitalar do Estado, a quem Cabral reconhece ter mordido em R$ 2,5 milhões para a campanha de Pezão.

Quando Michel Temer assumiu o governo, noticiou-se que dois de seus ministros, Henrique Alves e Geddel Vieira Lima, defendiam a legalizaçã­o do jogo. Ambos estão em cana.

Com as loterias legalizada­s, em 1993, o deputado João Alves, da Comissão de Orçamento, justificou seu patrimônio informando que ganhara 200 vezes na loteca, embolsando o equivalent­e a US$ 9 milhões.

Talvez fosse boa ideia instalar cassinos legais com roletas viciadas nas cadeias onde está a freguesia da Lava Jato. Lá eles apostariam livremente o que lhe sobrou das roubalheir­as que praticaram.

Ele pensou em Ana Claudia e em Dayane, mudou a rota do ônibus e salvou o Enem de 15 estudantes

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