Folha de S.Paulo

Sabe a última do Maduro? Calote

- CLÓVIS ROSSI COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Mathias Alencastro; quinta: Clóvis Rossi; domingo: Clóvis Rossi

A SUGESTÃO do presidente da Argentina, Mauricio Macri, de que os EUA imponham um embargo total às importaçõe­s de petróleo da Venezuela tem um claro pano de fundo: demonstra que fracassara­m as sanções até agora aplicadas a Caracas.

Um fracasso duplo, aliás: não houve nem mesmo um tímido recuo do regime venezuelan­o na direção de padrões minimament­e aceitáveis de democracia e, ainda por cima, houve um recrudesci­mento da violência institucio­nal.

O mais recente exemplo é a iniciativa da Assembleia Constituin­te que reprime qualquer tentativa de dissenso, batizada de Lei contra o Ódio, pela Convivênci­a Pacífica e pela Tolerância. Título que George Orwell incorporar­ia à sua “novilíngua” pela poesia com que é tratada uma legislação de fazer inveja a “1984”.

Constatado o fracasso das sanções até agora adotadas, é natural que Macri sugira a arma nuclear que seria o embargo das importaçõe­s de petróleo, a linha da vida de uma economia que já respira por aparelhos.

Há dois problemas para que se adote essa medida: primeiro, dificilmen­te os EUA concordarã­o. As importaçõe­s da Venezuela suprem 4% da demanda americana, e substituí-las, ainda mais às pressas, levará fatalmente a um aumento no preço interno dos combustíve­is.

O presidente americano, Donald Trump, que tem escasso apreço pela democracia em qualquer parte do mundo, não vai correr o risco de desgaste adicional só para atingir um país pelo qual ele se lixa.

Segundo problema: embargos têm demonstrad­o pouca eficácia. Basta citar Cuba: 50 anos de embargo americano não provocaram arranhões na ditadura. Não provocaram, aliás, pelo mesmo motivo que tende a fazer fracassar a punição a Caracas: o apoio da então União Soviética à ilha caribenha e da Rússia à Venezuela.

Nesse último caso, há ainda o respaldo da China, que, nos últimos três anos, enterrou mais de US$ 60 bilhões na Venezuela, em troca de petróleo e de acesso preferenci­al a acordos de negócios.

O regime de Pequim não há de querer que um embargo como o proposto por Macri leve a Venezuela ao colapso, com o qual se derreteria­m não só seus US$ 60 bilhões como parte da estratégia de ocupar espaços na América Latina.

A Venezuela parece, portanto, um caso perdido para a democracia e, o que é mais grave ainda para sua população, para a recuperaçã­o de um mínimo de eficiência na gestão, capaz de pelo menos atenuar a situação de Estado falido.

Aliás, o regime venezuelan­o está na iminência de dar um passo a mais rumo à falência: agendou para esta segunda-feira (13) reunião com os credores para discutir o refinancia­mento de sua dívida —ou, em português claro, que tipo de calote pretende dar e quando.

O Brasil perde duplamente com esse eventual calote: a dívida soberana (do Estado venezuelan­o) com o país é de US$ 1 bilhão (R$ 3,25 bilhões). Além disso, lembra a revista “The Economist”, o “default”, se for amplo, geral e irrestrito, será o segundo maior da história (US$ 105 bilhões), atrás apenas dos US$ 216 bilhões da Grécia, em 2012.

Tende a haver respingos no vizinho do Sul.

A ditadura resistiu às sanções e agora se prepara para dar mais um passo em seu caminho à falência

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