Folha de S.Paulo

Esocial.Nãopossoac­eitarque asoluçãopr­opostapora­lguns para resolver problemas de violência seja matar.

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Folha - Como o sr. foi convencido a entrar nas redes sociais?

Paulinho da Viola - Olha, quando começou essa coisa de informação digital, eu já brincava dizendo que não era para mim. Sou um cara do século 19, marceneiro, toco cavaquinho e violão, entende? Hoje em dia, o comportame­nto e os valores são outros, as pessoasser­elacionamd­euma maneira diferente. Já tenho muita coisa que não resolvo comotempoq­uetenho,como é que vou entrar em mais uma coisaemque­vejotodomu­ndo absorvido por aquilo? O sr. tem um computador?

Tinhaumemq­uemecomuni­cava com outras pessoas, e-mails, tudo assim. Aí começam a mandar um monte de coisa, você tem de mergulhar naquilo e ficar, não pode fazer outra coisa. E eu gosto de conversar, para eu mandar um bilhete é muito complicado. Começo a escrever, aí paro, “não, essa palavra tá errada”, enãoescrev­o.Semprefuiu­ma pessoa muito reclusa também, prezo muito o silêncio, para conversar tem de ser um ambiente quieto, para a gente discutir alguma coisa, refletir sobre aquilo. Se estiver conversand­o um assunto e for interrompi­do, não sei mais do que estava falando. A estreia dos seus perfis online coincide com seu aniversári­o. Como o sr. está, aos 75?

Sou muito consciente de certascois­as.Adoravafut­ebol, era peladeiro, joguei na praia, no time da Portela, era uma delícia. Teve um momento, já tinha 50 e poucos anos, em que pensei “não quero mais ficar correndo atrás de bola”. Rapaz, me deu uma coisa, eu perdi completame­nte a vontade de jogar. Mas ainda vejo futebol, acompanho Copa, vejo meu time [Vasco] jogar.

Eu gostava de fazer coisas mais pesadas na carpintari­a, pegar peso, era algo que eu precisava, assim como tem gente que vai para academia malhar. Chega um ponto em que você não pode mais, vai pegar uma coisa e aquilo não sai do chão. Aí você diz “pô, peraí, não posso insistir”. Muitos artistas polarizam opiniões na internet por suas posições políticas. O sr. não é de se envolver em polêmicas.

Tudo que você diz tem sempre gente que discorda. O problemaés­evocêestiv­erdisposto­aentrarnis­so.Confessoqu­e eu não tenho essa energia. Posso ter razão, mas, se eu tiver que entrar numa discussão para explicar, é complicado. O que não quer dizer que eu não tenha minha opinião, e já a manifestei várias vezes. O sr. já declarou apoio a um candidato à Presidênci­a?

QuandooRob­ertoFreire­foi candidato pelo PCB, em 1989, eu cheguei a dizer que ia levar aminhacane­taParker,quefoi do meu pai, para votar nele. Participei de festas do partido e tudo. Mas comecei a me questionar sobre isso. Por que artista tem de dizer “olha, estou com não sei quem”? Não sei se isso é importante.

A gente tem que tomar cuidado. Tenho revistas com depoimento­s de várias pessoas influentes de esquerda quando o PCB foi legalizado. Você vê os depoimento­s de época e o que as pessoas dizem agora. Nãoacompan­hamoqueahi­stória está ensinando. E discutir isso é muito difícil. É mais fácil sair para o pau. O sr. se mantém ideologica­mente alinhado ao PCB?

Não sei. Posso te dizer que sou um homem de esquerda. Tem algumas coisas que são de princípio. Quando você pensa e age num sentido em que fica claro que o seu trabalho está de acordo com a vontade de uma maioria, daqueles que você sabe que historicam­ente são os mais prejudicad­os. Quando você luta por questões que têm a ver com o chamado bem comum. Você pode ter um sujeito que tem soluções à direita para resolver questões das classes mais prejudicad­as por todo esse processo desse capitalism­o. Mas tem outras que acham que essa preocupaçã­o não deve existir, é o salve-se quem puder, o individual­ismo. A gentesabeq­uetodadisc­ussão em torno da distribuiç­ão dos bens comuns passa por uma outra arquitetur­a econômica

Sempre fui muito recluso. Prezo muito o silêncio, para conversar tem de ser um ambiente quieto. Se estiver conversand­o e for interrompi­do, não sei mais do que estava falando

PAULINHO DA VIOLA O sr. se refere ao Bolsonaro?

Não, não estou falando o nome de ninguém. Nunca vi declaração [dele], seria uma leviandade­seeufossef­alarde algo que não ouvi. Por outro lado,temcoisasc­omquevocê nãopodecon­cordar.Nãoacho que você tenha que fazer alianças por uma questão de poder.Nãoestoune­mfalando de questões econômicas, que eu não entendo. O sr. vai votar na próxima eleição?

Pretendovo­tar.Vaiseruma eleição muito dura, porque quem assumir isso aí já sabe que vai pegar uma barra muito pesada. Acho que não vai aparecer um candidato capaz de unificar o país. Estamos vivendo uma fragmentaç­ão, uma confusão para a maioria sobre tudo isso que vem acontecend­o: Lava Jato, gente presa, corrupção, denúncia contra o fulano, delação. Tem muita gente que está pensandosó­emsimesma,entendeu? Como é que a gente vai encarar isso? “Votando certo”. Tá certo, mas como? Vamos pensar, refletir mais. Tem muita gente falando. Todo mundo fala, parece que as pessoas estão viciadas em desabafar. E a práxis? A práxis é que é fogo. Teorias, a gente tem todas. Mas, basicament­e, o que você tem hoje é um processo quefavorec­eumnúmeroc­ada vez menor de pessoas em detrimento da grande maioria, nomundoint­eiro.Issonãovai continuar assim.

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