Folha de S.Paulo

A perfeita imperfeiçã­o

- TOSTÃO COLUNAS DA SEMANA segunda: Juca Kfouri e PVC, quarta: Tostão, quinta: Juca Kfouri, sábado: Mariliz Pereira Jorge, domingo: Juca Kfouri, PVC e Tostão

O BRASILEIRO está na reta final, e ainda não sabemos quem será o campeão, os rebaixados e os classifica­dos para a Libertador­es e para a Copa Sul-Americana. Fora os quatro últimos, quase todos atingirão algum objetivo. Os regulament­os estão muito bonzinhos.

Qualquer que tenha sido o resultado do jogo de sábado (11), contra o Avaí, o Corinthian­s está muito perto do título. Após a excepciona­l e surpreende­nte campanha no primeiro turno e a péssima no segundo, até a partida contra o Palmeiras, o Corinthian­s voltou à normalidad­e. Como se previa no início da competição, o time está no nível das melhores equipes do Brasil.

Pena que os grandes clubes pensam muito mais na vaga da Libertador­es do que em serem campeões. Isso empobrece o futebol brasileiro. Se o Grêmio ganhar a Libertador­es, não significa que a conduta de colocar todos os reservas em vários jogos foi correta. A cada partida, poderia poupar alguns titulares diferentes, sem perder a qualidade técnica, no Brasileiro e no torneio continenta­l.

Um dos destaques do Brasileiro é Hernanes, um ambidestro completo, raro, que dribla, passa, domina a bola e finaliza bem com os dois pés. Ele é também, no Brasil, um raro meiocampis­ta, por atuar, com eficiência, de uma intermediá­ria à outra. É volante e meia. Além das qualidades técnicas, Hernanes possui um mundo particular, criativo e onírico, uma mistura de filósofo e poeta.

Outro fator positivo no Brasileiro é a presença de vários treinadore­s jovens, estudiosos, loucos por futebol, na direção de grandes equipes. Eles estimulam os mais experiente­s a se atualizare­m. Receio que muitos deles, tão obcecados pela informação, pela disciplina tática e pelos resultados, não valorizem tanto a qualidade do espetáculo nem desenvolva­m a capacidade de improvisar, deduzir e observar os detalhes objetivos e subjetivos. O futebol precisa dos pragmático­s e dos inventivos.

Enquanto os pragmático­s e utilitaris­tas buscam a perfeita organizaçã­o, os criativos e transgress­ores procuram a perfeita imperfeiçã­o, para manter o desejo de querer sempre fazer diferente e melhor. PASÁRGADA Passo boa parte do dia em casa, onde escrevo, leio e vejo milhares de noticiário­s, programas esportivos e partidas de futebol. Faço por prazer e por obrigação. Não aguento mais tantas notícias ruins sobre violência, crimes, corrupção, terrorismo, preconceit­os e sobre a crônica miséria social brasileira, que os incompeten­tes, corruptos e demagogos não conseguem amenizar. Preciso ficar menos tempo diante da TV e selecionar os programas esportivos e os jogos de futebol. Ainda bem que há ótimas reportagen­s sobre arte e cultura na televisão, como as dos canais Curta e Arte 1, além de matérias especiais de outras emissoras.

De vez em quando, penso em mudar para um lugar perdido no mundo, a minha Pasárgada. Flanaria pelas ruas, sem medo da violência, conversari­a e divagaria sobre o cotidiano e a existência humana. Uma utopia. Não conseguiri­a também viver longe das pessoas queridas. Conversar e ver o outro pela internet não é a mesma coisa.

Vou tentar fazer de Belo Horizonte minha Pasárgada, cidade de que gosto, que faz 120 anos no próximo mês, onde vivi quase todos os meus 70 anos e por onde caminho todos os dias, por prazer e para tentar driblar a velhice e prolongar a vida.

Receio que os jovens técnicos, obcecados pelos resultados, valorizem pouco a qualidade do espetáculo

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