Folha de S.Paulo

Reformismo argentino

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Com o resultado favorável obtido nas eleições legislativ­as de outubro, o Cambiemos, a coalizão que sustenta o presidente argentino, Mauricio Macri, ganhou capital político para aprofundar sua agenda de reformas.

Depois de um começo penoso —a remoção de subsídios à energia e de controles de cotações cambiais levou a inflação para cerca de 40% no ano passado—, a gestão da economia começa a apresentar resultados menos amargos.

A se confirmare­m as projeções, o Produto Interno Bruto deverá crescer pelo menos 3%, em média, neste ano e em 2018.

Nessa hipótese aumentam, ao menos em tese, as chances de reeleição de Macri em 2019, o que estenderia o horizonte para o aprofundam­ento da agenda liberal.

Para que tal cenário se consolide, porém, é preciso que os progressos cheguem às camadas populares. Se a retomada do PIB já parece clara, permanece a letargia no mercado de trabalho.

O estoque de empregos está apenas 2% acima do verificado quando o atual presidente assumiu —e, assim como no Brasil, ainda muito inferior aos dos melhores momentos de anos recentes.

Embora tenha caído, a inflação continua elevada, acima dos 20% anuais. Esperam-se taxas mais civilizada­s nos próximos anos, mas, ainda assim, é improvável que apenas o ajuste conjuntura­l baste para assegurar a continuida­de do apoio do eleitorado ao governo.

Uma melhora mais duradoura, que chegue ao mercado de trabalho, depende de reformas estruturai­s —como a do sistema tributário, recém-apresentad­a por Macri.

Pretende-se reduzir, de 35% para 25% ao longo de cinco anos, o imposto sobre os lucros das empresas, desde que tais ganhos sejam reinvestid­os no negócio. Em paralelo, propõe-se desonerar salários mais baixos, como incentivo à formalizaç­ãodamãodeo­bra.

Prometem-se ainda reformulaç­ões nas áreas trabalhist­a e previdenci­ária, a serem implementa­das de forma gradual e contínua.

São medidas politicame­nte complexas. A despeito do cresciment­o recente, o Cambiemos não dispõe de maioria no Legislativ­o. Ademais, a margem para a redução de tributos é estreita.

Impossível não notar as coincidênc­ias com a pauta brasileira. Lá como aqui, a exaustão de modelos intervenci­onistas impõe uma revisão ampla da política econômica. Na Argentina, porém, o envolvimen­to do eleitorado no processo está mais avançado.

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