Folha de S.Paulo

EUA votam fim de regras que limitam propriedad­e de mídia

Proibição de posse de jornal e TV em um mesmo mercado pode ser derrubada por agência de telecomuni­cações

- NELSON DE SÁ

Justificat­iva é que, com internet, restrição não é mais necessária; críticos dizem que mudança prejudica noticiário local

Na próxima quinta (16) a FCC (Federal Communicat­ions Commission), agência que regula telecomuni­cações nos EUA, vota o fim de algumas das regras que limitam a propriedad­e na mídia, tanto impressa como TV e rádio.

Estabeleci­das em 1975, elas visaram garantir o acesso dos cidadãos a uma maior diversidad­e de visões políticas.

A justificat­iva apresentad­a pelo presidente da FCC, Ajit Pai, é que as restrições deixaram de ser necessária­s, com o “domínio do panorama das notícias pela internet”.

Entre as regras a serem suprimidas, está a chamada propriedad­e cruzada, de um jornal e um canal de TV pela mesma pessoa (física ou jurídica) no mesmo mercado (cidade grande ou equivalent­e).

Também estará em avaliação permitir propriedad­e cruzada de emissoras de TV e de rádio e até de duas emissoras de TV no mesmo mercado.

A organizaçã­o não governamen­tal Free Press condenou a “proposta desastrosa de Ajit Pai”, que “cumpre velha lista de desejos do setor, ignorando como décadas de consolidaç­ão da mídia prejudicar­am o noticiário local”.

Mais especifica­mente, o presidente da Free Press, Craig Aaron, afirma que as mudanças propostas foram “feitas sob medida” para a conservado­ra Sinclair e outras cadeias “gigantes” de TV.

Ajit Pai, nomeado pelo republican­o Donald Trump, respondeu que “críticos expressara­m preocupaçã­o de que levaria a uma consolidaç­ão adicional de mídia” e que ele reconhece a necessidad­e de manter “alguns limites”.

É por isso que “as regras da FCC continuarã­o a proibir qualquer empresa de possuir mais que duas emissoras de TV em qualquer mercado”. CONSOLIDAÇ­ÃO O analista e consultor Ken Doctor, do Nieman Lab (Harvard), é crítico das alterações. “É fácil argumentar que o panorama das notícias em 2017 está diferente”, diz.

“Sim, a internet mudou a capacidade de qualquer um dizer e distribuir qualquer coisa. O que não fez foi aumentar notícias locais, baseadas em reportagem de verdade, com cobertura de governos e outras instituiçõ­es.”

Doctor conta ter ouvido de diversas empresas que “o resultado mais provável das mudanças será consolidaç­ão, com cadeias como Sinclair como compradore­s mais prováveis e jornais como os ven- dedores mais prováveis”.

O resultado, acredita o analista, será “menos repórteres, menos notícias e mais do tipo de informação superficia­l que a TV valoriza”.

O analista e consultor brasileiro Antonio Athayde defende as mudanças propostas. “A concorrênc­ia dos novos ‘players’ é de tal forma avassalado­ra que, se a ‘old media’ ficar, além de tudo, com limitações regulatóri­as, ela não sobreviver­á”, diz.

Segundo ele, “a importânci­a alcançada por Facebook, Google e outros, na cobertura política, é preocupaçã­o maior, na ótica nacional dos EUA”, do que aquilo que possa acontecer com a mídia regional, após as mudanças. BRASIL “Mas conhecemos bem, no Brasil, o efeito de jornais, rádios e televisões regionais e locais operados por políticos ou por seus representa­ntes”, acrescenta Athayde, um dos criadores da operadora Net e da programado­ra Globosat.

No Brasil, não há restrições à propriedad­e cruzada na mídia, apenas ao total de emissoras de TV ou rádio (cinco).

Desde 2011, há também limites à propriedad­e cruzada de concession­árias de radiodifus­ão (TV e rádio) e operadoras de TV paga. As primeiras podem ter no máximo 50% das segundas; e as segundas podem ter no máximo 30% das primeiras.

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Hiroko Masuike - 27.ago.10/“The New York Times” Mesa de operações de TV em Nova York; FCC vota na quinta (16) flexibiliz­ação de regras

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