Quem visitar a nova atração do prédio do Instituto Moreira Salles, na avenida Paulista,
chegará a dois telões opostos, cada um em um canto da sala retangular. Tambores de uma bateria desmantelada, presos de ponta-cabeça na parte central do teto, vinculam uma extremidade e outra.
Trata-se do esqueleto de “Momento Presente”, obra inédita somada à exposição de mesmo nome do albanês Anri Sala. A mostra chega a São Paulo nesta terça (12), após ocupar a sede carioca do instituto ao longo de 2016.
Os polos dialogam ao som de “Noite Transfigurada”, sexteto de cordas do austríaco Arnold Schoenberg (18741951), conhecido por ter rompido com a tradição tonal e, posteriormente, estabelecido a técnica do dodecafonismo.
Apesar de ter aberto um novo leque de possibilidades para a música clássica, Schoenberg leva a fama de ser mais comentado do que tocado em salas de concertos. “Gurre-Lieder”, uma de suas obras, te- ve sua primeira execução no Brasil somente em 2015.
“É como Duchamp. Schoenberg não é Picasso”, compara Sala, equivalendo o compositor austríaco ao artista plástico francês, que também ficou conhecido por romper com a tradição vigente em sua época —no caso de Duchamp, o conceito histórico de arte, ao utilizar objetos industrializados para compor seus trabalhos. PASSADO E FUTURO Sala isola as notas ré de um filme exibido no telão de um dos lados e, do outro, as sis bemóis. A partir da repetição dessas notas destacadas, o artista reconstrói a composição da fase romântica tardia do austríaco, aludindo à técnica de música degenerada que Schoenberg criaria anos depois. É como se a versão mais velha do compositor, já modernista, conversasse com a mais nova, diz Sala.
Para ele, as repetições das notas também remetem ao trabalho repetitivo e padronizado das cadeias de produção aplicadas pelo fordismo e pelo taylorismo. “É um fenômeno social que não existe no tempo de ‘Noite Transfigurada’ e só vai acontecer anos depois na história”, diz Sala, novamente contrapondo o futuro e o passado.
Com duração de 15 minutos, a metade inicial da videoinstalação é somente sonorizada. Em seguida, exibe-se o ensaio de uma orquestra de câmara, com enfoque nos cotovelos dos músicos.
Para a curadora Heloisa Espada, essas imagens carre- gam o estilo serialista da obra. “Elas são ‘clean’. Sabese que as pessoas estão tocando, mas não há uma narrativa”, diz Espada. MARIPOSAS E O TEMPO