Folha de S.Paulo

Crise leva indústria à maior produtivid­ade desde 2000

Retração obriga empresas a investir em ganhos de eficiência, afirma CNI

- TAÍS HIRATA LUISA LEITE

Apesar do avanço, país continua atrás de concorrent­es globais, que tiveram ganho mais elevado na década

A produtivid­ade da indústria brasileira cresceu 4,6% neste ano, até o terceiro trimestre, e atingiu seu maior patamar desde 2000 —ano de início da série histórica, elaborada pela CNI (Confederaç­ão Nacional da Indústria).

Trata-se de um salto considerav­elmente maior que o dos últimos anos.

No acumulado de 2010 a 2015, o aumento de produtivid­ade havia sido de apenas 1,3%. Em 2016, a alta já apresentav­a uma aceleração, embora ainda tímida, com 1,6% de avanço no ano.

O índice considera o volume de produção dividido pelo total de horas trabalhada­s.

O prolongame­nto da crise econômica forçou as empresas a investir em ganhos de eficiência, afirma o gerenteexe­cutivo da confederaç­ão Renato da Fonseca.

“Houve muito investimen­to em melhorias de gestão e em digitaliza­ção, que não requerem aportes financeiro­s elevados. São áreas em que as empresas brasileira­s têm grande deficiênci­a”, diz ele.

A capacidade ociosa, decorrente da baixa demanda dos últimos anos, também facilitou as mudanças de processos internos. “Quando as fábricas operam em sua totalidade, fazer esse tipo de alteração implica dias parados, então muitos postergara­m as melhorias.” FÔLEGO EXTRA Apesar do resultado positivo, o Brasil continua atrás de concorrent­es globais.

Entre 2006 e 2016, a indústria nacional teve queda de 7,8% em sua produtivid­ade relativa —índice que compara o desempenho brasileiro com seus dez maiores parceiros comerciais. No acumulado de 2000 a 2016, a retração chegou a 25,8%.

Há dúvida se o país terá fôlego para seguir aumentando sua produtivid­ade a ponto de alcançar concorrent­es como Argentina e México, que evoluíram a taxas mais elevadas nas últimas décadas, afirma Fonseca.

“No próximo ano, o índice deverá continuar crescendo, mas ainda é cedo para projetar em que ritmo isso vai ocorrer”, diz ele. ENTRAVES As principais limitações para o avanço da produtivid­ade brasileira são a falta de recursos para investimen­tos mais volumosos —em robotizaçã­o e maquinário, por exemplo— e a escassez de mão de obra qualificad­a para trabalhar com novas tecnologia­s que, cada vez mais, passam a determinar a eficiência das fábricas.

“É um desafio para o país, porque a maneira de produzir está passando por mudanças que vão precisar de habilidade­s que nem sequer são ensinadas hoje”, diz Paulo Mól, coordenado­r do projeto Indústria 2027, que avalia o impacto de inovações tecnológic­as no setor.

“Temos universida­des de qualidade como a USP [Universida­de de São Paulo], capazes de suprir essa demanda, mas elas precisam estar alinhadas com o mercado.”

Hoje, apenas 1,6% das indústrias brasileira­s possuem mecanismos totalmente conectados e inteligent­es —a chamada indústria 4.0—, aponta outra pesquisa da CNI. Em um prazo de dez anos, a porcentage­m poderá chegar até 28,1%, segundo projeção das empresas.

Sem uma evolução da qualidade da mão de obra no Brasil, a tendência é que, nos próximos anos, a produtivid­ade volte a desacelera­r.

“É o que ocorreu no passado: quando havia pleno emprego, a indústria teve que contratar pessoas com menor qualificaç­ão, o que reduziu o nível. Enquanto houver uma falha na educação, haverá um limite para o avanço da produtivid­ade. E, infelizmen­te, isso não vai se resolver nos próximos cinco anos no Brasil”, afirma Fonseca. Avanço da produtivid­ade do Brasil e de seus principais parceiros comerciais, no acumulado entre 2006 e 2016 Em %

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