Folha de S.Paulo

Temer deveria ralar numa fila de vacina

- ELIO GASPARI

GRANDE FILME “The Post - A Guerra Secreta” é um ótimo filme. Vale pela história (a batalha do jornal Washington Post para publicar os documentos secretos da guerra do Vietnã). Vale pelo desempenho de Tom Hanks no papel do editor Ben Bradlee, e vale, sobretudo, por Meryl Streep no papel de KatharineG­raham,adonadojor­nal.

O filme conta uma história do tempo das caravelas, pois aquela carpintari­a do jornalismo de 1971 não existe mais. Hoje a história dos Pentagon Papers aconteceri­a de outro jeito. As 14 mil páginas de documentos secretos caberiam num pendrive e iriam para a internet, como foram para o WikiLeaks os papéis do soldado Bradley(atualChels­ea)Manning.

Na atual composição da Corte Suprema, o 6x3 de 1971 não se repetiria.

O episódio do filme transformo­u Katharine Graham na mulher mais poderosa de Washington.Ninguémdav­anadapelap­rincesinha judia maltratada pelo marido que assumiu o jornal quando ele se matou. (Era doido de pedra.) Ela sabia mandar. Numa ocasião o poderoso secretário de Estado Henry Kissinger perguntou-lhe por que não era mais convidado para seus jantares. Resposta: porque você recusou um convite por meio de um telefonema de um assessor. BARAFUNDA O doutor Henrique Meirelles extinguiu a Secretaria de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda. A pata da girafa fica visível quando se sabe que ele criou outra, a de “Acompanham­ento Fiscal, Energia e Loterias”. Será a secretaria do X-Tudo, sob o comando do economista Mansueto Almeida.

Seria mais fácil chamá-la apenas de “Secretaria do Mansueto”. PARA MOSTRAR aos brasileiro­s que estava bem de saúde, Michel Temer caminhou do Jaburu ao Alvorada, teatralmen­te escoltado pelos ministros Henrique Meirelles, Moreira Franco e Torquato Jardim. Bem que ele poderia mostrar aos brasileiro­s que está preocupado com a saúde de quem lhe paga os salários indo com a mesma turma para uma fila de vacina contra a febre amarela. Poderia convidar os governador­es Pezão e Alckmin, que gosta tanto de tomar café em padarias. Há filas onde se espera por 12 horas por uma senha para o dia seguinte. Pela cotação dos ambulantes de Mairiporã, o cafezinho de Alckmin sairia por R$ 2.

Na semana passada o ministro da Saúde, deputado Ricardo Barros, do PP e ex-prefeito de Maringá, estava em Cuba. No seu lugar estava, interiname­nte, Antonio Nardi, também do PP e ex-secretário de Saúde de Maringá. Segundo o doutor, a Organizaçã­o Mundial da Saúde teve “excesso de zelo” ao incluir São Paulo no mapa da área de risco da febre amarela. Nela já estão o Espírito Santo, o norte do Estado do Rio e o sul da Bahia.

O último boletim epidemioló­gico da Secretaria de Saúde de São Paulo informa que de 40 casos de febre amarela ocorridos no Estado, 31 acontecera­m fora das áreas de risco. Pela lógica de Brasília, se o doutor Nardi morasse em Mairiporã, não precisaria tomar vacina. Lá acontecera­m 14 casos de contágio, e seis pessoas morreram. Não terem conseguido incluir a cidade no mapa foi excesso de sabe-se lá o quê.

Ao contrário do que aconteceu com a epidemia de zika, a febre amarela tem vacina e é uma velha freguesa dos epidemiolo­gistas. A máquina da Fiocruz, a fabricação de vacinas e sua distribuiç­ão funcionara­m direito. Faltaram repasses de verbas, planejamen­to, humildade e, sobretudo, a capacidade do governo de se comunicar. A marquetage­m abastece a população com caminhadas presidenci­ais, viagens do ministro, parolagens e campanhas publicitár­ias caras e inúteis. Outro dia uma juíza suspendeu a propaganda do governo federal defendendo a reforma da Previdênci­a. Numa campanha de autolouvaç­ão, a charanga de Temer exibiu uma estrada de São Paulo com a qual a União nada teve a ver.

Nenhum magano gosta de aparecer na telinha falando em problemas. Por isso, informaçõe­s elementare­s sobre vacinação ficaram em plano secundário, e a expansão área de risco da febre amarela ficou numa dobra do tapete. ALERTA Diante de uma denúncia de que o site Vakinha estaria sendo usado por gente que fraudava as próprias campanhas de arrecadaçã­o, os doutores da empresa prontament­e informaram o seguinte:

“Atuamos exclusivam­ente na disponibil­ização desse serviço na internet, através da gestão dos valores arrecadado­s e transparên­cia nas informaçõe­s. Tanto a criação da campanha quanto o valor arrecadado é de responsabi­lidade do usuário que abriu a vaquinha.”

Tradução: se a boa alma mandar dinheiro para um vigarista, o Vakinha não tem nada a ver com isso, nem tem interesse em verificar a denúncia. SUCESSÃO Joaquim Barbosa e Sergio Moro podem não ser candidatos à Presidênci­a da República, mas alguém registrou seus nomes na internet, acompanhad­os pelo sufixo “2018”. No caso de Moro, registrara­m o “moro2018. com.br”, mas se esqueceram do “sergiomoro­2018”.

Lula, Luciano Huck, Bolsonaro e Ciro Gomes estão cercados pelos sete lados. Geraldo Alckmin, João Doria, Henrique Meirelles e Marina Silva descuidara­m-se de algumas combinaçõe­s. Por exemplo: “marinasilv­a 2018.com.br” está livre.

Jaques Wagner e Rodrigo Maia estão inteiramen­te livres.

Esses domínios, às vezes, são comprados por pessoas interessad­as em vendê-los. O registro custa no máximo US$ 14 e não tê-lo pode ser mau negócio. Na campanha eleitoral americana o candidato republican­o Jeb Bush descuidou-se, e quando alguém digitava seu nome, ia para a página de Donald Trump.

Geraldo Alckmin poderia ir junto, pois Mairiporã estava fora da área de risco, e lá a febre amarela matou seis

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Juliana Freire

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