Folha de S.Paulo

Múltis aceleram envio de lucro ao exterior

Com melhora da economia e eleição imprevisív­el, companhias aumentam remessas pela 1ª vez em quatro anos

- ÁLVARO FAGUNDES JOANA CUNHA

Como parque industrial está ocioso, empresas não têm urgência para investir no país, apesar dos sinais de retomada DE SÃO PAULO

As multinacio­nais aproveitar­am o fim da recessão econômica e a melhora das margens de lucro para, pela primeira vez em quatro anos, aumentar o envio de lucros e dividendos do Brasil para suas matrizes no exterior.

A remessa de lucros e dividendos cresceu 34% de janeiro a novembro do ano passado em relação ao mesmo período de 2016, para US$ 13,8 bilhões, segundo o BC.

O valor está distante do recorde para o período (US$ 25,1 bilhões em 2011), mas interrompe uma sequência de três quedas seguidas.

Giovanni Cordeiro, economista da Deloitte, aponta, com base em dados da Economatic­a, que a margem líquida das empresas, que desceu ao patamar de 1,85% na mediana no terceiro trimestre de 2015, se recuperou para 3,7% em 2017 —distante, porém, dos 4,8% em 2012.

Além da melhora do cenário econômico, com a volta do cresciment­o do PIB, as incertezas sobre a eleição presidenci­al deste ano também estão entre as razões que ajudaram nesse movimento de repatriaçã­o de resultados.

“O risco do país é realidade. As empresas vão esperar a coisa ficar mais clara em 2019 em relação ao novo governo. A alta das remessas ainda sofre influência das expectativ­as sobre o que vai ocorrer com o real. Se você acha que a moeda vai se desvaloriz­ar, tem um incentivo para mandar para fora”, diz Carlos Primo Braga, professor da Fundação Dom Cabral.

A trajetória de queda na taxa de juros (a Selic caiu 6,75 pontos percentuai­s em 2017 , para 7% ao ano) é outro aspecto que pode ter reduzido o interesse das múltis em manter o dinheiro no Brasil, de acordo com Fernando Giacobbo, sócio da PwC.

“Quando uma empresa está com caixa disponível, ela avalia se é bom manter o recurso em aplicações financeira­s aqui. Mas ela já não tem mais a remuneraçã­o que tinha no ano anterior”, diz.

Somado a tudo isso, o parque industrial ainda opera com ociosidade (apesar da melhora recente, a capacidade instalada ainda está distante do patamar de 2014) e não tem urgência de investir em aumentar a capacidade por enquanto, a despeito dos sinais de retomada.

“Além da queda na taxa de juros, também não existe perspectiv­a de manter esses recursos aqui como fonte de financiame­nto para investir em aumento de capacidade produtiva”, diz Giacobbo. NOVA ONDA Os Estados Unidos lideraram o envio de dinheiro das múltis, respondend­o por 31,1% do total remetido em 2017 até novembro, ou US$ 4,3 bilhões. Em 2016, as americanas estavam praticamen­te empatadas com as empresas holandesas: 25,4% e 25,3%, respectiva­mente.

O resultado antecipa uma onda que pode se fortalecer neste ano, quando passa a ser aplicada a reforma tributária americana aprovada pelo governo Donald Trump, com a redução da alíquota de Imposto de Renda para as empresas, de 35% para 21%.

“Enquanto isso, no Brasil estamos na ordem de 34%. A menos que o governo brasileiro faça também uma reforma tributária, haverá mais incentivo para repatriar o dinheiro para os Estados Unidos”, afirma Carlos Braga, da Fundação Dom Cabral.

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