Folha de S.Paulo

Consumidor trata comida como religião, diz professora

Para especialis­ta, alimento leva a modismos, como aversão ao glúten e a tecnologia­s como o transgênic­o, o que não é sustentáve­l

- CAROLINA LINHARES

Pesquisa da Bayer feita em julho de 2017 com 10 mil pessoas em dez países, inclusive o Brasil, mostra que 46% entendem que pesticidas mantêm a saúde das plantas, mas 79% preferem orgânicos.

Em relação aos transgênic­os, 52% reconhecem seus benefícios ambientais, mas 72% evitam comprá-los.

Com 10 bilhões de pessoas no mundo em 2050 (hoje são 7,6 bilhões), será preciso produzir mais com menos recursos naturais e, por isso, diz Adrian Percy, chefe de pesquisa e desenvolvi­mento da divisão agrícola da Bayer, “a tecnologia não é uma oportunida­de, mas uma necessidad­e”.

“É preciso ser transparen­te: mostrar aos consumidor­es as pesquisas e os resultados. Há um retrocesso da sociedade em muitos aspectos, como política e ciência, bem quando mais precisamos dessa revolução.”

Para a professora Louise O. Fresco, presidente da Universida­de e Centro de Pesquisa Wageningen (Holanda), a “comida virou uma religião”. “Existe, por exemplo, uma escola de pensamento que diz que comer pão é ruim. Cientifica­mente, não faz sentido, mas as pessoas acreditam.”

Outra questão é o glúten, cuja porcentage­m de intolerant­es se mantém na faixa de menos de 1% da população há décadas, segundo a pesquisado­ra. “Em alguns países, 20% da população sente que tem problema com glúten. Isso é religião.”

Georgie Aley, presidente de um instituto de ciência de alimentos na Austrália, define o mercado de comida como o mercado da moda —o consumidor dita a tendência, do sem glúten ao orgânico, da quinoa ao abacate.

“Num cenário de aumento da classe média e aqueciment­o global, temos que balancear as modas e expectativ­as para ter um sistema sustentáve­l”, diz.

Fresco afirma, porém, que é preciso ser tolerante com essas crenças e que deve haver variedade de escolhas, mas diz ser necessário combater a falta de informação.

“Amamos a tecnologia, amamos nossos celulares, mas queremos que a comida seja tradiciona­l”, ironiza.

“O futuro não está em voltar ao manual, não dá para produzir dessa forma calorias necessária­s para 10 bilhões de pessoas.”

A Europa é o continente mais restritivo em relação aos alimentos geneticame­nte modificado­s. Para Fresco, isso ocorre porque “algumas gerações depois da Segunda Guerra nunca experienci­aram falta de comida”.

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